Essa é uma viagem que nunca cogitei fazer, diferentemente de todas as outras que fiz. Há tempos venho desejando conhecer alguns países da Ásia. Vietnam, Tailândia, Japão, Coreia do Sul, são alguns que me interessam e a Índia não estava entre eles. Adélia, companheira de muitas viagens, tempos atrás me convidou para uma viagem a China e, um tempo depois, para um roteiro pelo Vietnam, Laos, Camboja e Tailândia. Por problemas pessoais tive que recusar o convite. Resolvi que em 2024 viajaria para qualquer país, desde que fosse na Ásia, e o país escolhido por Adélia e Katia foi a Índia.
INDIA
Estava indo para o Rio de Janeiro quando Adélia ligou:
- Tá olhando as mensagens no grupo?
- Não - respondi.
- Aurea avisou que o voo que sairia as 03:00h atrasou, está previsto para sair as 06:00h. Então vem aqui pra casa, dá tempo de dormir um pouco.
Choveu muiiiito em Dubai, como nunca antes aconteceu naquele país. Eles não estavam preparados para esse tipo de evento que gerou até alagamento, quem diria?
Tentei dormir, mas não consegui. Adélia dormia tranquilamente o sono dos justos, e eu mais acesa que um vagalume. A idade me trouxe problemas de sono, que ainda estou tentando resolver.
Nosso voo atrasou ainda mais, saímos do Rio às 07:30.
Chegamos em Dubai no início da manhã do dia 19.04. Depois do café da manhã Adélia e Kátia foram dormir e eu fui pra rua, na força do ódio, depois de passar duas noites em claro e mais um voo de 15h. Terei pouco tempo, não posso desperdiçar. Aurea, que é a dona da agência Blanc Tour, nos acompanha nessa viagem e nos convidou pra irmos junto com ela no mercado do Creek do Ouro e especiarias e depois ao Shopping Dubai Mall, Vou com elas e mais tarde vou ao Burj Kalifa.
Esse lugar é um grande mercado, bem popular por aqui. A maioria das lojas são pequenas, mas as jóias são enormes, com um gosto bem específico dos árabes. Isso aqui é um Saara chique, os vendedores surgem do nada e começam a te pressionar para ver e comprar alguma coisa, chega a ser irritante. Quando percebem que somos brasileiras começam a nos chamar de Anita ou Shakira (não sabem que ela é colombiana). Muitos deles repetem a frase "Lula ladrão" e "Bolsonaro legal". Alguns do nosso grupo respondem que eles estão errados, mas eles não desistem e continuam com a mesma toada. Entrei em algumas lojas, mas não comprei nada, vou gastar meus dólares na Índia e não será com jóias, com certeza.
Quando se aproximou a hora do meu passeio ao terraço do prédio mais alto de mundo, deixei o grupo e me dirigi ao Burj Khalifa. A Torre do Khalifa é um prédio de 160 andares que foi construído em seis anos. O acesso a Torre pode ser feito pelo shopping Dubai Mall, um dos maiores shoppings do mundo. Como ainda tinha algum tempo livre, aproveitei para conhecer um pouco do shopping e tomar um capuccino, não aquele capuccino coberto com pó de ouro, sou mais o tradicional.
Subimos os andares em poucos segundos, nem dá pra perceber o movimento do elevador. Nas paredes espelhadas do elevador são projetadas fotos da cidade em construção, o que me fez lembrar de outra torre, a do World Trader Center de Nova Iorque. Chegando lá em cima um guia nos orienta e dá explicações a respeito da torre, em seguida temos 45 minutos para apreciar a paisagem, comprar algum souvenir ou beber alguma coisa. É claro que a maioria do tempo é gasto com as fotos, essa mania que parece só piorar. Como eu estava sozinha e detesto selfie, pedi a um rapaz que batesse duas fotos minhas. Ficaram horríveis, deletei as duas. A cidade vista aqui de cima dá bem a medida da sua grandeza. Tudo aqui foi construído em tempo recorde, na década de setenta a maior parte dessa área ainda era um deserto. Essa cidade deve ser um desafio para os arquitetos. Como fazer um novo prédio bonito, funcional e diferente de tudo que há por aqui? Tarefa difícil. Achei tudo muito cinza, o céu não é azul como é bonito ser, talvez não seja sempre assim. Quem sabe o pôr do sol coloque um colorido nessa paisagem.
Cheguei no hotel e encontrei minhas amigas prontas para sair e jantar. Tinha dito a elas que iria junto pra comemorarmos o aniversário de Kátia e Áurea, mas minha energia já esgotou, sou um vela que já derreteu e só resta uma pequena chama que não vai durar muito. Tomei um banho e pedi o jantar no quarto. Preciso dormir bem porque o dia amanhã vai ser puxado.
20.04. 2024
Nosso voo pra Nova Deli é cedo, temos que tomar um café da manhã bem rápido e partir. Quando eu e Adélia chegamos no Hall do hotel já havia um grupo de malas com uma etiqueta vermelha, como a da Blanc Tour. Adélia olhou e achou que não era do nosso grupo, então colocamos nossa mala num cantinho e fomos para o café. Quando Kátia chegou perguntei se ela tinha colocado a mala junto da nossa.
- Coloquei junto com as outras malas do grupo - respondeu ela.
Depois verificaram que várias pessoas do nosso grupo tinham cometido o mesmo engano, colocaram as malas juntas com a do outro grupo, por causa da etiqueta de identificação vermelha. Eu não poderia jamais ser responsável por nenhum grupo de viagem, tem que se ter uma paciência de Jó para lidar com tanta gente distraída, sendo que eu sou uma delas.
NOVA DELHI
Templo Akshardham |
Chegamos no Aeroporto Internacional Indira Gandhi em Nova Delhi. A Blanc Tour contratou um serviço de Atendimento VIP pra esse aeroporto, porque a imigração aqui é um pouco complicada e cheia de burocracia, ter alguém pra resolver nossos eventuais problemas será útil. Um grupo de rapazes, uns cinco ou seis, se apresentaram ao nosso grupo e nos ajudaram com o preenchimento de um formulário entregue ainda no avião. Mesmo tendo sido contratado um acompanhamento VIP, não escapamos de alguns dissabores. Alguns funcionários do Controle de Imigração foram extremamente mal educados e nem todos receberam no avião o formulário da alfândega o que gerou um atrito entre algumas pessoas. Superado os dissabores iniciais, partimos pra conhecer Nova Delhi, essa cidade que se tornou capital da India em 1911, desde que Calcutá deixou de exercer essa função.
Passamos por uma área muito arborizada onde se encontram Embaixadas e prédios importantes do governo local. As avenidas são largas e o trânsito é intenso o que não é de se admirar numa cidade de mais de vinte nove milhões de habitantes. A minha cidade não chega a trezentos mil habitantes e eu adoro que seja assim, não me vejo morando numa cidade tão populosa.
Chegamos ao Hotel The Imperial Nova Delhi. A primeira impressão que eu tive era que estávamos entrando em um palacete de algum Marajá, embora nunca tenha estado em um deles. Na chegada recebemos um colar de cravos - não os cravos que espetavam a cabeça de Cristo, mas as flores - uma moça pintou um sinalzinho vermelho no meio de nossa testa e nos ofereceu uma bebida, um suco de alguma fruta. E entramos nesse prédio de uma arquitetura belíssima, muito mármore, belos lustres antigos, móveis de madeira rosada, e um jardim muito verde no entorno do hotel. Um luxo só.
Saímos para olhar o jardim que estava sendo preparado para alguma festa, um casamento talvez. O guia falou alguma coisa sobre essas festas, que as pessoas mesmo não tendo sido convidadas, serão bem recebidas. Eu prefiro não arriscar, não tenho vocação pra "penetra".
Deixamos nossas malas no quarto e descemos para trocar alguns dólares por rupias, a moeda indiana. Aproveitei, também, para comprar e instalar um chip local no meu celular. Em Dubai ganhamos o chip de presente ainda no avião e trocamos sem nenhum contratempo. Já na India foi bem diferente, a burocracia impera. Tiraram foto do passaporte, tiraram foto com quem está comprando o chip e mais uma porção de procedimentos. Enfim, fomos liberados para trocar os dólares. Cada dólar compra 83,00 rupias. Kátia trouxe uma bolsa grande imaginando que o volume de notas seria muito grande, mas como trocamos apenas 300,00 dólares o volume não foi tão grande assim.
Saímos pra conhecer um mercado que alguém indicou. Nessa procura um indiano se aproximou e tentou nos ajudar. Achei o cara muito solicito e desconfiei das boas intenções dele, mas acabamos aceitando sua informação. Ele disse que o mercado fica perto a uns quinhentos metros do local onde estamos. Kátia queria ir a pé, mas eu e Adélia preferíamos ir de tuc-tuc. O indiano imediatamente chamou um tuc-tuc que estava ali bem perto e nós embarcamos...numa furada. Logo vimos que a distância não correspondia ao que ele falou e quando chegamos no destino vimos que não era o mercado que procurávamos. Nada nos interessou, voltamos ao tuc-tuc e retornamos ao hotel. Maior perda de tempo.
Escolhemos o restaurante italiano do hotel para o nosso primeiro jantar na India. O restaurante tem uma área externa bem bonitinha, mas escolhemos o interior pois com a temperatura alta um local refrigerado é mais confortável. Tínhamos marcado com Carolliny de nos encontrarmos em frente ao restaurante as 21:30, mas como ela não apareceu resolvemos entrar. Quando já estávamos pagando a conta, por volta de 23h, ela chegou e disse:
- Vocês já comeram?
- Sim. Você não estava lá na entrada quando chegamos, fomos até o hall pra ver se você estava por lá...resolvemos entrar – informou Adélia.
- Eu estava esperando e como vcs estavam demorando resolvi entrar. Aí vi vocês aqui.
- Mas nós chegamos 21:30h, agora são 23:00h.
- Putz!!! Meu relógio não atualizou o horário, ainda está com o horário de Dubai.
Essa pode disputar comigo o troféu de mais distraída. Ela ficou sem jantar, não quis pedir nada, disse que estava sem fome e preferia dormir um pouco porque Waldir, seu marido, irá chegar de madrugada. Ele veio do Brasil um dia depois do grupo.
21.04. 2024
Tomamos nosso café e iniciamos a nossa jornada pela India. Chegando ao ônibus, que nos acompanhará na maior parte da viagem, encontramos nosso guia Vipul, o rapazinho chamado Shotu e o motorista que tem um nome difícil de gravar. Ele é muito simpático, usa um turbante coral onde esconde os longos cabelos, porque segue o Sikhismo e todo Sikh usa barba e não corta os cabelos.
Vipul - Nosso Guia |
Começamos pelo Templo Akshardham, o maior da Índia e que foi construído em tempo recorde, sete anos. Todo em pedra de arenito e mármore, um belíssimo trabalho de artesões do mundo todo. Esse trabalho só foi concluído tão rapidamente porque recebeu o financiamento de um construtor hindu e mais de sete mil voluntários trabalharam na obra. Pena que não se pode tirar fotos do interior do templo.
Seguimos para Qutb Minar ou Torre da Vitória, outro orgulho da Índia. Delhi já viveu sob o comando de povos muçulmanos, depois se beneficiou com o poder Mogol, foi dominado pelos Persas e, por último, foi a vez dos ingleses. Acredito que todos eles deixaram suas marcar e seus símbolos de vitória, como esse que estamos visitando, é assim que se comportam todos os poderosos em qualquer lugar do mundo. Esse lugar – a Torre, Ruínas de duas Mesquitas, Túmulos - é uma herança do período em que a cidade foi dominada pelos mulçumanos. Essa Torre resistiu bravamente a vários terremotos e raios e hoje é um Patrimônio Mundial. Versos do Alcorão estão gravados nas paredes de arenito do Qutb Minar. Vipul nos falou que os mulçumanos demoliram vários templos hindus que existiam ali e usaram o material na construção da Mesquita. Os nossos políticos seguem a mesma linha, destroem o que foi feito pelo seu antecessor e constroem os seus próprios símbolos.
Qutb Minar |
Qutb Minar |
Subir e descer tantas escadas com esse clima quente e sempre com o corpo todo coberto, é um desafio. Sobe os degraus, tira o calçado, coloca o propé ou uma meia, cobre os ombros, cobre a cabeça, cobre as pernas, bebe muita água para não desidratar. Ufa!!! Respira fundo e segue o baile, obedecer às regras é essencial porque aqui é assim e na casa dos outros temos que respeitar a regras da casa.
Jama Masjid, |
Saímos da mesquita diretamente pro fervo que é essa cidade. Embarcamos num Riquixá, uma carrocinha de duas rodas com um pequeno estofado que cabem duas pessoas e é puxada por um homem dirigindo uma bicicleta. Se for puxado por uma moto é chamado de Tuc-Tuc. Esse transporte é muito comum na Àsia. Confesso que fiquei com um certo medo, porque o trânsito é uma doideira, e o transporte não oferece nenhuma segurança. Nos embrenhamos pelas ruelas do mercado Chandni Chowk ao som ensurdecedor das buzinas, o colorido dos saris que as indianas usam, homens de turbante, o cheiro dos temperos e no meio de toda essa confusão, as vacas, essa deusa suprema que todo indiano protege. No final a gente acaba se acostumando com o barulho e o trânsito caótico. Adorei o passeio de Riquixá, só fiquei com pena do homem que saiu carregando duas mulheres pesadas no meio dessa loucura e ele é bem magrinho, como são os indianos em geral.
Depois do almoço fomos conhecer a Porta da Índia. Esse monumento lembra um pouco o Arco do Triunfo em Paris. Foi construído para homenagear os soldados durante a Segunda Guerra Mundial e nas Guerras anglo-afegãs. A Porta é margeada por jardins com gramado bem verde, um convite ao turista cansado e já sonolento por causa do calor e da barriga cheia. Eu e Adélia não resistimos, nos jogamos no gramado. Deitar é mole pra mim, o duro é levantar. Dependendo do grau de cansaço, sinto vontade de convocar um guindaste.
Porta da India |
O assédio dos vendedores é cansativo. Temos que compreender a diferença cultural que nos separa, mas tem momentos que é difícil. São muitos vendedores e muitas são crianças, elas seguem caminhando ao seu lado e se pondo a sua frente mesmo depois de dizermos não várias vezes. As meninas enfiam as pulseiras nos nossos braços com uma agilidade invejável. Oh Deus! Todos os Santos! Namastê!!!!! Dai-me paciência.
Eu e Adélia fomos dar um mergulho naquela piscina maravilhosa, antes do jantar. O calor está demais, só uma cerveja bem gelada pra amenizar, e foi isso que fizemos. Um mergulho, algumas braçadas e depois a cerveja bem geladinha pra fechar com chave de ouro.
Mais tarde saímos com algumas pessoas do grupo para jantarmos no Restaurante Connaught Clubhouse, que fica próximo ao nosso hotel.
Enquanto esperávamos o grupo todo se reunir, ficamos conversando e em determinado momento comentei com a Ângela que poucas vezes na minha vida conversei com outra Ângela. Ela disse que o mesmo acontecia com ela. Continuamos a conversa e descobrimos que tínhamos muito mais coisas em comum, além do nome. Temos a mesma altura (1,77m); na infância e adolescência detestávamos ser altas; éramos um pouco corcundas por causa da vergonha em relação a altura; ela tinha uma irmã, e eu um irmão, que nos mandavam esticar o corpo e ficar eretas, o que detestávamos; carregávamos a bandeira do Brasil nos desfiles cívicos e também detestávamos; achávamos que não conseguiríamos um namorado mais alto que a gente; era difícil encontrar um sapato bonito por causa do tamanho do pé. E por aí vai, as semelhanças são muitas.
O restaurante é um lugar bem legal, com música indiana ao vivo, comida deliciosa, mas apimentada. Pedimos sem pimenta, veio com menos pimenta, mas ainda assim picante. A noite foi ótima.
22.04.2024
Hoje começamos o dia pelo bairro antigo de Delhi, um lugar lotado de turistas e locais, um caos total.
Nosso guia, Vipul, durante o trajeto do ônibus sempre nos fala um pouco sobre a história da India e os hábitos e costumes dos indianos. Hoje ele falou sobre o significado das palavras, dos gestos, etc. Para o indiano tudo tem um significado, toda palavra tem um fundamento. É claro que não posso reproduzir tudo que ele falou, mas foi uma explicação bem interessante. Nos locais que visitamos e visitaremos, ele nos conta um pouco da história de cada lugar, nos preparando previamente para o que veremos em seguida. Eu sempre achei, em todas as viagens que faço, que é essencial a presença de um guia local. Nada como alguém que conhece a fundo a história pra mostrar um prédio, um monumento, um lugar. A história é que dá vida as coisas inanimadas.
O próximo templo é o Sikh Bangla Sahib. Esse é um templo para Hindus e Sikhs. É todo branco com cúpulas douradas, muito bonito, lembra as igrejas ortodoxas da Rússia. No jardim interno tem um grande lago onde os fiéis se banham porque acreditam que essa água possui poderes milagrosos. Tiramos os sapatos e cobrimos a cabeça. Tive que pegar emprestado uma calça comprida (a própria igreja cede a roupa), porque minha roupa não cobria totalmente as pernas. Logo chegamos numa sala muito ampla onde várias pessoas sentadas no chão aguardavam pela comida que estava sendo servida. Milhares de pessoas comem ali diariamente, esse salão está sempre repleto durante todo o dia, informou Vipul. Outros templos, dessa e de outras religiões, também servem comida para os fiéis e até para visitantes. Vipul sempre afirma que nenhum indiano passa fome. Todos que ali trabalham são voluntários, seja na cozinha, seja na limpeza, e assim colocam em prática os princípios de igualdade e fraternidade.
Sikh Bangla Sahib |
Saímos do templo varados de fome, o aroma gostoso da comida servida no templo despertou nosso apetite. Almoçamos e em seguida fomos visitar o túmulo de Mahatma Gandhi.
O Raj Ghat é uma plataforma quadrada, de mármore negro com algumas guirlandas de cravo sobre a plataforma onde estão guardadas as cinzas de Gandhi. Disse Vipul que no momento da cremação mais de um milhão de indianos estavam no parque. Esse parque, onde está inserido o Raj Ghat, tem um extenso gramado cercados por várias espécies de árvores. Apesar da quantidade de visitantes, esse lugar é bem silencioso. É comum quando o dirigente de um país está em visita a Nova Delhi, que ele(a) plante uma árvore característica do seu país nesse parque. Eu fiquei algum tempo sentada na sombra de uma dessas árvores. No chão em frente da árvore tem uma plaquinha com o nome da árvore, o nome de quem plantou e de qual país. Lembro que Fernando Henrique plantou uma árvore aqui. Lula, presidente três vezes, é provável que também tenha plantado alguma. Se o dia não estivesse tão quente e o parque não fosse tão grande, eu teria procurado pela árvore. Será que foi uma jabuticabeira, nossa árvore genuinamente brasileira? Ou foi Pau-Brasil?
Raj Ghat |
Voltando pro hotel, paramos no Khan Market, um mercado a céu aberto, maraviiiilhoso. Tem lojinhas incríveis, para todos os bolsos. Começamos a jornada das compras. Comprei um vestido lindo, vermelho. Gosto do vermelho em pequenas peças: uma blusa, uma pashiminas, um tênis, mas nunca um vestido ou um macacão. Sou muito alta e toda de vermelho fico parecendo um semáforo com a luz vermelha acesa. Mas não resisti, esse vermelho me agradou.
Adélia e Kátia foram para o mercado tibetano aqui perto do hotel. Eu preferi a piscina, fazer compras não é o meu forte. Encontrei com Cristina na piscina, nossa companheira de viagem que é jornalista e trabalhou no Judiciário junto com a Renata, uma bibliotecária que também está nessa viagem. Ficamos aproveitando o início da noite de molho nessa água gostosa papeando e nos conhecendo melhor.
Escolhemos jantar num restaurante Tailandês do nosso hotel. Ele é bem bonito, tem colunas pintadas com motivos típicos da Tailândia, um teto esverdeado, provavelmente em madeira entalhada em formato de escama de peixe, muita cor vermelha, amarela e coral nas pinturas das paredes, nos objetos e adornos. Comi comida tailandesa uma única vez, em Tiradentes. Gostei, embora estivesse mais apimentada do que estou acostumada. Hoje pedi um Pad Thai que é um prato bem popular, macarrão de arroz com outros acompanhamentos.
23.04. 2024 AGRA
Vipul passou toda viagem até Agra falando sobre o sistema de castas e sobre casamento. Ele disse que noventa por cento dos casamentos são arranjados pelas famílias. Eu assisto series coreanas, chinesas, indianas, tailandesas e vejo que isso ainda acontece, mas não imaginava que o percentual era tão alto. As mulheres depois que se casam mudam para a casa da família do marido, o contrário acontece, mas com raríssima exceção. Moram todos juntos, nunca estão sós. Eles acham que isso diminui o stress. Será? Só se for na India. Ele tem um amigo que mora numa casa com 56 pessoas e isso é perfeitamente normal pra eles. A cerimônia de casamento aqui pode levar até sete dias, a depender da condição financeira dos noivos, mas não são sete dias de festa, nesse período tem rituais de preparação. Um dia é só para a família, onde eles dançam e ensaiam coreografias para a grande dia, tem o dia da pintura das mãos com henna...e tem mais algumas coisas que o Vipul falou, mas não me lembro e estou com preguiça de pesquisar no Google.
O casamento de Vipul aconteceu durante a pandemia e compareceram 674 pessoas. Se não fosse a pandemia seriam mais de mil pessoas, disse ele.
É claro que fizemos muitos questionamentos sobre esses costumes, principalmente da escolha dos noivos pela família.
- E onde fica a paixão – alguém perguntou.
- O casamento aqui é para sempre – esclareceu Vipul -, a paixão é passageira, ela acaba. Acontece, quando somos mais novos, de nos apaixonarmos. Vivemos aquela paixão, mas na hora de escolher a esposa ou o marido, nossa família é quem escolhe. As vezes a família contrata um casamenteiro para procurar o parceiro adequado. Não quer dizer que somos obrigados a casar com alguém que não nos agrada. Tem um primeiro período onde nos encontramos com a (o) pretendente para nos conhecermos melhor. São alguns encontros e, nesse período podemos recursar o pretendente, mas temos que dizer o porquê da recusa.
- E senão der certo, tem que permanecer casado a vida toda?
- Não, a pessoa pode se divorciar, mas isso é muito raro na Índia. Quando isso acontece o divorciado só se casa novamente com alguém também divorciado ou viúvo (a). A lei não obriga, mas é assim que acontece.
E ele foi explicando as vantagens desse modelo e como se comportam no casamento. Alguns requisitos são bem relevantes: a casta a que pertencem, a religião, a idade e a situação financeira. Disse que depois vai explicar sobre as castas. Sempre tive vontade de entender esse negócio, vamos ver se entendo a explicação que ele dará.
Chegamos ao Hotel Oberoi no início da tarde. Que maravilha de hotel!!!! Além de lindo ainda tem um “plus”, daqui é possível ver a parte superior do Taj Mahal. Pena que vamos passar apenas uma noite aqui.
No meio da tarde fomos conhecer o Forte de Agra ou Forte Vermelho. Logo na chegada me senti mal, parecia que a pressão estava baixa e o calor pode ter provocado esse mal estar. Brochei, desisti de subir, vou ficar aqui embaixo, na sombra, e esperar a turma voltar. Nilza se aproximou e me ofereceu água, eu tinha esquecido a minha no ônibus. Vipul alerta sempre para a necessidade de beber água sempre, o clima aqui é muito seco e quente. Tomei a água e logo em seguida melhorei.
Essa construção não é apenas uma fortaleza, no seu interior tem também palácios utilizados pelos soberanos mongóis. Um dos palácios, de mármore branco, é todo decorado com motivos florais por artista renomados da Ásia. Aqui viveu o poderoso Shah Jahan, que construiu o mausoléu para sua amada esposa, o ponto turístico mais conhecido da Índia, o Taj Mahal. Mais tarde o seu filho tomou o trono e o prendeu nessa fortaleza. Ali ele passou isolado seus últimos anos e de lá ele podia ver ao longe o Taj Mahal. Depois de morto foi colocado no túmulo ao lado do túmulo da esposa.
A noite fomos ao teatro assistir um musical que conta a história de amor de Shah Jahan e sua esposa preferida. Digo a preferida porque ele não era homem de uma única mulher, afinal era um Marajá, tinha doze esposas. O espetáculo foi legal, nada muito grandioso, mas os dançarinos são bons.
Fort de Agra |
Acordamos com o nascer do sol, saímos para o Taj as 05:30h. Esse é o melhor horário porque está mais fresco e o público é menor. Realmente essa é a coisa certa a fazer, o calor à tarde é infernal e tem pouca sombra. O Taj confirma o tamanho do amor de Shah Jahan. Sempre falamos que as fotos são mais bonitas que os lugares. Concordo em parte, pois nesse caso achei o Taj mais bonito ao vivo, talvez pelo jardim a sua volta e pelos outros mausoléus menores, das outras esposas do Shah Jahan, mas simplesinhos, feitos de arenito vermelho. O da amada é todo de mármore branco contendo inscrições retiradas do Alcorão. É incrustado com pedras semipreciosas, tais como: jade, ametista, turquesa, lápis-lazúli, cristal e ouro. A sua cúpula é costurada com fios de ouro. O mausoléu é conhecido como a maior prova de amor do mundo, é quase uma história de amor de Shakespeare. Só faltou um pouquinho mais de tragédia.
Depois de conhecer o Taj Mahal vamos tomar nosso café da manhã e partir para Jaipur. Temos que abandonar nosso maaaaaravilhoso hotel. O hotel lá de Jaipur é da mesma rede, mas não veremos o Taj da janela do nosso quarto.
São seis horas até Jaipur, é hora de aproveitar e descansar. A paisagem aqui na Índia não é muito convidativa, tudo está seco nessa época do ano e o céu é sempre meio acinzentado, não sei se é pela poluição ou se pela proximidade do Deserto do Rajastão.
Jaipur é conhecida como a cidade dos marajás, que hoje têm dinheiro, mas não tem poder. Segundo o guia eles nem tem tanto dinheiro assim. Amber Fort também conhecida como Forte de Amer, é uma fortaleza e também um Palácio que mistura o estilo hindu e muçulmano. A construção fica no alto de uma colina com uma vista bem bonita. Pra chegarmos até lá fomos no ônibus que nos tem acompanhado nessa viagem, até uma cidadezinha ao pé do morro e de lá até o Fort fomos de jipe. Somos 5 pessoas mais o motorista, e segurança zero. As ruas são estreitas e movimentadas, pessoas e vacas transitam nesse espaço e os jipes que lutem por espaço. Sentei na parte de trás e fiquei atenta porque se o motorista der uma freada brusca eu vou parar no asfalto. Antigamente os turistas podiam subir de elefante, hoje não pode mais e mesmo que pudesse eu prefiro correr o risco de subir a colina num jipe. Depois de sobreviver ao acesso dos vendedores ambulantes, conseguimos entrar na fortaleza. Ufa! É difícil, eles desconhecem a palavra ''não'' continuam insistindo sem esmorecer. É o jeito deles e a necessidade de sobreviver.
Depois de muitas rampas e degraus chegamos na parte alta da fortaleza. O forte possui templos, jardins, fontes, palácios, etc. Uma fortaleza aqui na India, nunca é só um forte, funciona também como um palácio de moradia e palácio do governo. Ele é conhecido pelo seu tamanho, são seis quilômetros de muralha, e pelo seu estilo único que mistura as culturas mulçumana e hindu.
Já no final da visita paramos numa sala que tinha um corrimão próximo a parede. Cansados que estávamos, nos encostamos no corrimão e aguardamos Vipul nos dar as próximas orientações.
- Sabe porque esse corrimão de cobre está tão polido e brilha tanto? Sabem quem limpa o corrimão? – perguntou nosso guia.
Respondemos que não sabíamos.
- Bunda de guia e de turista – respondeu irônico.
Prestando atenção deduzimos que é isso mesmo, porque só o corrimão está brilhando, as peças verticais que sustentam o corrimão estão pretas.
Ele é sempre sério, tá começando a se soltar.
Fort Amber |
Fizemos uma visita ao Museu Anokhi de Impressão Manual, que é dedicado à arte da impressão manual. Logo na entrada do belo prédio do museu fica um café bem simpático, sentei sob a sombra do guarda-sol e pedi uma água com gás bem gelada. Senti-me tentada a ficar por ali, mas o prédio tão bonito e bem restaurado me atraiu.
A visita vai mostrando a história e também o trabalho das pessoas executando os complexos processos de impressão manual e os entalhadores. Alguns vestidos tradicionais raros, roupas com designs únicos, criados pelos artesãos, artigos de decoração, técnicas de tingimento, casacos e jaquetas, colchas, e ferramentas utilizadas no artesanato como blocos de madeira e ferro, cinzéis, furadeiras, etc. fazem parte do acervo do museu.
Museu Anokhi |
Eu, Adelia, Katia, Waldir e a esposa Carolliny, almoçamos na mesma mesa. Adélia trabalhou na Petrobras em Macaé, onde eu a conheci na década de noventa do século passado (vixe, me senti velha). O Waldir também trabalhou em Macaé, depois foi para o nordeste e hoje trabalha no Rio. A conversa acabou resvalando para o trabalho na Petrobras, lembramos de momentos especiais, de bons colegas e de outros nem tão bons assim.
Depois do almoço fomos a uma construção de três andares onde só se vende produtos têxteis, tem de tudo e tudo entulhado, parece a “bacia das almas” nas lojas populares do Brasil. Eu fico tonta com tanta oferta, não consigo escolher nada, ainda mais que tem que pechinchar. Lembrei da minha amiga Thaiz, ela ia amar esse lugar. Olhei em volta e vi o Roberto, sentadinho tomando um chá, enquanto a esposa Adriana participa da folia das compras. É pra lá que eu vou. Sentei, pedi um chá e fiquei papeando com Roberto. Alguém jogou umas capas de almofadas do meu lado, achei bonitas e pensei que Thaiz pode gostar. Puxei duas pro meu lado e, pra não dizer que sai dali sem gastar uma única rúpia, comprei as duas capas.
26.04.2024
Hoje pela manhã Katia notou que tomou todos os remédios que seriam da manhã do dia seguinte. Eu também peguei o remédio para repor a flora intestinal em caso de diarreia (remédio que trouxe por prevenção) e coloquei na caixinha semanal achando que era remédio pro colesterol. Percebi o engano a tempo. A memória de velho é uma merda, não confio em velho, com raríssimas exceções.
Elefantes e vacas têm privilégios na Índia, acho que se pode dizer que são quase semideuses. Não sei se dizer isso é ofensivo, não me arrisco a falar isso para um indiano. Não tive sequer coragem de dizer que adoro uma costela bovina no churrasco, isso seria uma afronta. Mas não são só essas duas espécies que recebem um bom tratamento, os animais, de modo geral, são bem tratados. Tem muitos hospitais públicos para atender todo tipo de animal. Um pombo com a pata machucada será socorrido e levado ao hospital. Imagine se fosse no Brasil? O pombo não teria a menor chance, seria um a menos pra cagar nas nossas praças.
Os macacos também tem sua vez, por isso vamos agora conhecer Galtaji. Esse lugar é um antigo local de peregrinação dos hindus. Vipul disse que ainda hoje existem peregrinos que vem para cá. Existem seis templos aqui, o local é fabuloso, mas em péssimo estado. A paisagem em volta também é bonita, alguns prédios em ruinas tem afrescos desbotados que ficarão lindos se forem restaurados. Uma fonte natural desce da colina e enche os tanques onde os fiéis tomam um banho de purificação. Os fiéis descartam a roupa molhada que é pendurada na cerca que margeia a escada e leva a um pequeno templo na parte mais alta da colina. Muito feio esse amontoado de roupa pendurada no corrimão da escada.
O local também é conhecido como Templo dos Macacos pela quantidade de macacos que vivem aqui. Eles parecem calmos, mas Vipul avisou para não nos aproximarmos muito deles pois alguns podem ser agressivos e como a raiva pode estar presente em algum deles, até um arranhão pode nos obrigar a procurar um local para vacinação. Tinham alguns pequeninos que se aproximavam e um rapaz, que parece trabalhar no local, colocava o macaquinho no braço dos turistas. Resolvi arriscar e deixei um deles subir no meu ombro.
Galtaji |
Caminhando para o nosso ônibus passamos por pilhas de restos de legumes e frutas que demoram a ser recolhidos dali, o que aumenta o aspecto sujo do lugar. Uma pena!
Vamos visitar o Palácio da Cidade. Esse palácio fica numa das largas avenidas do centro da cidade e todas as construções naquela região seguem um mesmo padrão, as paredes são de estuque pintadas de uma cor rosada. Isso foi ideia de um marajá do século XIX, quando recebeu a visita do Príncipe de Gales, que depois seria o Rei Eduardo VII da Inglaterra, e por isso a cidade é conhecida como a “Cidade Rosa”, cor que simboliza, para os indianos, a hospitalidade. Esse complexo não é apenas um palácio, tem vários pátios, pavilhões, jardins, templos, museu. A família real ainda reside ali, numa parte que é privativa. O lugar é lindo e muito bem conservado.
Palácio da Cidade |
Paramos para algumas fotos em Hawa Mahal, também conhecido como Palácio dos Ventos. É mais um palácio rosado como o Palácio da Cidade, seu exterior de cinco andares é semelhante a um favo de mel com inúmeras janelas pequenas com treliças de um desenho bem singular. A existência dessas treliças tinha dupla intenção. Uma delas era tornar o ambiente mais fresco e a segunda intenção era permitir que as damas reais observassem, sem serem vistas, a vida cotidiana e as festas que aconteciam na rua em frente ao palácio. A realeza também gostava de uma fofoca.
Depois do almoço no Restaurante Baradari fizemos um passeio de Tuc-tuc pelo centro de Jaipur e depois andamos pelo comércio do centro. Não aguentei fazer compras nesse lugar, muito assédio dos vendedores, muitos pedintes, muitas lojas, muito calor...isso é um coquetel terrível pra mim. Resolvi permanecer na loja onde será nosso ponto de encontro para voltarmos ao hotel. Novamente fui a única mulher a não se interessar pelas compras. Desse jeito vai sobrar dólar nessa viagem.
À noite o hotel oferece um pequeno show de dança durante o jantar. Kátia foi assistir, ela não perde nada. Eu e Adélia somos mais preguiçosas. Eu me contento com uma cerveja gelada e um banho refrescante na piscina, depois vou dormir mais relaxada pra enfrentar a próxima jornada.
27.04.2024
Ontem quando chegamos ao quarto do hotel encontramos um mimo de presente. O hotel nos deu uma echarpe em tons de verde e azul com estampa de pavões, símbolo do hotel. Uma folha comprida, de alguma árvore, com uma mensagem escrita com tinta dourada, nos desejava bons momentos em nossa estadia na Índia. Hoje, quando entramos no ônibus para partir, cerca de seis empregados ficaram perfilados ao longo do canteiro, próximo ao ônibus, exibindo cartazes de despedida e agradecimento. Tudo muito delicado, como é o estilo deles. É verdade que a diária é caríssima, mas um tratamento cordial agrega muito valor ao hotel. Foi bacana.
Pensei na mensagem escrita com letras douradas naquela folha e achei que poderia acrescentar ''uma boa proteção contra bactérias''. Não seria ruim, mas é claro que seria uma piada.
Algumas companheiras de viagem ficaram surpreendidas porque a Ângela, minha xará, recebeu mais alguns mimos que o restante do grupo. Ora, ela é espetacular, super atenciosa com os empregados do hotel, com o motorista, o ajudante do ônibus que nos atende, e conosco também. Gentileza gera gentileza, já dizia o profeta niteroiense. Sempre desconfio da bondade excessiva, já tive várias oportunidades de constatar que por traz da bondade existe um outro sentimento nem um pouco nobre. É claro que existem exceções, e há pessoas em que esse sentimento é genuíno, penso que esse é o caso da Ângela.
Tomamos o café da manhã e partimos para Jodhpur, nosso próprio destino, que fica a 07 horas aproximadamente daqui.
Em boa parte do trajeto Vipul nos fala sobre assuntos de interesse pro grupo e responde a nossas perguntas. Algumas vezes ele fica puto porque alguém pergunta sobre algo que ele já falou. Renata e Cristina levam um fora de vez em quando, mas elas não se estressam, quanto mais ele responde atravessado, mais elas gostam dele.
“Na Índia existem vinte duas línguas oficiais e mil e seiscentos dialetos, 80% falam ou entendem o inglês. Nas escolas são ensinadas três línguas: o hindi, a língua oficial do estado e o inglês. Se um indiano viaja da sua região para outra região da Índia, geralmente ele não entende o que falam, a não ser que falem em hindi e não no idioma local. Hospitais públicos são muito bons e os remédios são baratos, os melhores médicos atendem no serviço púbico. Escolas públicas não são tão boas, as particulares são melhores. Existe a profissão, informal, de pedinte. Existem vagas no mercado de trabalho, mas muitos preferem a vida de pedinte. Existe almoço nas escolas, mas tem mães que preferem levar as crianças para pedir esmola nas ruas, principalmente em locais turísticos, porque ganham mais pedindo que trabalhando. A falta de higiene é um problema que atualmente já está sendo trabalhado nas escolas. O indiano, de um modo geral, acredita que é sua obrigação limpar a própria casa, mas o que está fora dela é responsabilidade do Estado. O governo atual está investindo muito em educação ambiental, então acredita-se que daqui a dez anos os hábitos de higiene do povo indiano terá evoluído bastante – disse Vipul.”
Fizemos uma parada, na metade do trajeto, na cidade de Pushkar.
Essa é mais uma cidade sagrada, com um lago sagrado, talvez tenha um rio sagrado também. Não sou religiosa, mas respeito quem é, tampouco é uma crítica ao povo indiano, pois isso acontece em quase todos os países, exceto nos países comunistas. O que me espanta é que num mundo com tanta crença religiosa e com tantos símbolos sagrados, o comportamento não acompanha o que o ser humano professa. Estamos cada dia mais intolerantes, menos solidários, mais egoístas, mais cruéis, etc.
Esqueci de dizer que essa cidade é sagrada também para os hippies. Não sei dizer exatamente porque, mas me parece que a cidade tem um clima mais despojado, mais liberal, talvez algum chazinho tipo o santo daime.
Notei que a cidade é bem mais limpa do que as demais que conhecemos até agora, exceto pelas bostas de vacas, que são muitas por aqui. Fomos caminhando pela rua do Mercado, cheia de lojinhas como nas outras cidades. Paramos pra almoçar no restaurante Laura’s Café, que tem um terraço com vista para o lago. Daqui de cima é possível ver melhor o lago e seu entorno. Parece que tudo aqui gira em torno desse lago que é bem grande e tem umas divisões que formam as piscinas onde os fiéis se banham. Turistas também podem se banhar e receber uma benção de algum sacerdote, desde que sigam as regras de vestimenta e pés descalços. Não sei se cobram alguma coisa, esqueci de perguntar a Vipul, mas é provável que sim, não existe cafezinho grátis.
Adélia, Ângela e Kátia |
Vera, Nilza e Renata |
Lago de Puskhar |
Chegamos no final da tarde em Jodhpur, a “Cidade Azul”. Essa cidade também é muito quente, por isso foi pintada de azul, dizem que o azul refresca e espanta os mosquitos. Existe outra versão que diz que a pintura azul foi utilizada no passado para indicar as casas que pertenciam a brâmanes, o grupo de nível mais alto no sistema de castas indiano e únicos que tinham direito a usar esse tom índigo na fachada.
O hotel Raas Jodhpur é excelente, como os demais, sendo que esse tem um toque de modernidade misturado com parte de três construções antigas, do século XVII e XVIII, que existiam nesse lugar. Eles restauraram a parte antiga e construíram novas estruturas usando a mesma técnica e mesmos materiais utilizados na construção tradicional. Tudo isso num mesmo pátio cercado de jardins. Eles utilizam muito as treliças, que eu acho lindas, até mesmo nos quartos, para proporcionar mais luminosidade e frescor, embora em grande parte do dia só o ar condicionado resolva a situação.
28.04.2024 JODHPUR
Jodhpur fica entre o deserto, ao norte, e a savana, ao sul, e por isso muitos turistas que curtem o contato com a natureza aproveitam para conhecer esses dois lugares.
O ponto turístico mais visitado aqui é o Mehrangarh Fort, uma fortaleza que fica a 125 metros do nível da cidade. Do nosso hotel é possível admirá-lo, parece bem pertinho daqui.
Mercado de Jodhpur |
Fort de Jodhpur |
É uma fortaleza, mas também tem vários palácios conhecidos por suas intrincadas esculturas e pátios. A diferença para outros palácios é que aqui não mora ninguém. O Forte é na realidade um museu que mostra o modo de vida dos marajás e suas famílias. Nesses edifícios é possível encontrar uma vasta coleção de vestuários, instrumentos musicais, antiguidades, painéis, obras de arte, armas — incluindo vários canhões em bom estado de conservação — e quartos e cômodos reais decorados tal como eram na época em que os marajás e suas famílias circulavam pelos palácios. A vista aqui de cima é muito bonita e dá pra ver as casas azuis, não são todas azuis, mas a maioria.
Na descida, próximo a saída, vimos um quadro com mãos femininas esculpidas na parede. Vipul parou e nos contou o significado dessas mãos.
"Na época dos marajás, quando acontecia uma guerra e essa guerra era contra os mulçumanos, se o Marajá morresse nessa batalha e perdesse a guerra, sua mulher, a Marani, tirava a própria vida. Ela se vestia com o seu melhor traje, às vezes as vestimentas do seu próprio casamento, e se deixava queimar na pira usada para cremar o marido. A Marani e tbm outras mulheres de guerreiros faziam isso para se livrar do sofrimento e humilhação que os mulçumanos iriam impor a elas, preferiam queimar junto com os maridos do que serem estupradas e mortas pelos mulçumanos. Quando saíam para o local do ritual da cremação deixavam sua mão gravada na argamassa na entrada do Fort. Ainda hoje algumas pessoas que passam por aqui, param por um instante, colocam a mão sobre uma das mãos esculpidas na parede, e fazem uma prece silenciosa".
Na volta para a cidade notei que a distância entre o forte e o nosso hotel não era tão pequena quanto imaginei. Talvez por ser muito grande e ficar bem alto, só ele e o horizonte ao fundo, passa essa sensação de proximidade.
Seguimos para visitar outra grande atração dessa cidade, o cenotáfilo Jaswant Thada, que é um memorial fúnebre que homenageia um marajá. Ele não é tão bonito quanto o Taj Mahal, mas também foi feito em mármore branco com requintados detalhes esculpidos, treliças delicadas e um belo jardim no entorno do prédio. Diferentemente do Taj Mahal, esse lugar não possui apenas o memorial, é também um local de cremação para a família real de Jodhpur.
Fomos almoçar junto com Vipul no Restaurante Indigo, que ele indica. Seguimos caminhando para o restaurante, que fica não muito distante do hotel. Em um trecho parecia que estávamos andando numa dessas comunidades pobres das nossas cidades.
De repente notamos algo inusitado para nós, ocidentais, embutidos nun pequeno espaço entre duas paredes, um vaso sanitário que é um buraco com porcelana no chão, onde é preciso se agachar para usar, e dois mictórios. Tudo isso voltado para a rua e sem portas. Papel higiênico nem pensar. Deve ser interessante para nós, passarmos por ali enquanto alguém utiliza esse tipo de banheiro público.
O prédio do restaurante é modesto e pequeno. Subimos até o terraço, muitos restaurantes aqui na Índia ficam no terraço. Chegamos ao terceiro andar onde numa parte coberta funciona o restaurante. O lugar é simples e agradável, mas o calor tá insuportável e o ar condicionado parece que está com defeito. Chegamos a nos levantarmos para ir embora, mas alguém abriu as janelas e correu uma brisa. Ficamos. Pedimos uma cerveja pra começar. Nesse calor quando sentamos pra almoçar vem uma vontade incontrolável de homenagear o criador do universo Brahma, tomando uma beer (trocadilhosinho infame).
O almoço estava delicioso, a pimenta na medida certa, a cerveja bem gelada, e tudo isso pelo preço de trezentas rúpias, ou seja, dezessete reais. É muito barato comer aqui na Índia, barato para nós turistas.
Após o almoço Kátia e Adélia foram às compras, num local próximo ao hotel, e eu fui pra piscina. Nada como um bom mergulho após uma caminhada sob um sol quente e de bucho cheio.
À noite jantei com Katia no terraço de um restaurante do hotel. O lugar é lindo, tem uma vista do jardim do hotel iluminado por luzes suaves, Mehrangarh Fort no alto da colina também iluminado e a brisa agradável dessa noite de lua cheia. Pedimos um prato de arroz negro sem pimenta com um molho de iogurte. Veio com muiiiita pimenta. Tivemos que pedir pra trocar e fomos atendidas.
Partimos para Udaipur, mais sete horas de viagem, a última por via terrestre. indo pra Udaipur, a cidade dos lagos, que é considerada a cidade mais romântica da India.
Durante a viagem Vipul nos explicou como funciona o sistema de castas na India. Essa é uma curiosidade que eu tenho, vamos ver se a explicação me trará alguma luz.
"Esse sistema se baseia no mais importante livro sobre as leis hindus que justifica a necessidade do sistema de castas. Os hindus creem que existem quatro castas principais que se originaram diretamente do Brahma, o Deus o criador. Existem milhões de deuses no Hinduísmo, mas Brahma é o mais importante, é a força vital que criou tudo. Brahmin surgiu da cabeça do Brahma, os Kshatriya dos braços, os Vashya das coxas e os Shudras dos pés.
No início só existiam esses quatro tipos de castas e se enquadravam nela os sacerdotes, os militares, os fazendeiros e comerciantes, e por último os que deviam servir a castas superiores. As pessoas que não faziam parte de nenhuma das castas recebiam o nome de dalits. Diz-se que essas pessoas se originam da poeira dos pés de Brahma e tinham a incumbência de realizar os mais deploráveis trabalhos, aqueles rejeitados por indivíduos que integravam alguma das castas. Mais tarde, com o surgimento das novas profissões esse enquadramento foi se ajustando e hoje existem várias subdivisões nessas quatro castas originais. A divisão da sociedade em castas é determinada a partir da hereditariedade. No início os filhos seguiam a profissão dos pais e isso definia sua posição social, seus privilégios ou deveres. É possível saber a que casta uma pessoa pertence pelo sobrenome e em algumas cidades menores todos sabem a casta de seus vizinhos. Quando alguém entra no Tinder logo na primeira conversa ela costuma perguntar qual o sobrenome da pessoa, para identificar de que casta ela é. A partir da década de cinquenta a legislação passou a considerar crime a utilização do sistema de castas e com o surgimento das novas profissões tornou-se mais fácil a ascensão social de pessoas das castas mais baixas. Um exemplo disso é que o cargo de Presidente da India é atualmente ocupado por uma mulher de casta baixa” – nos explicou Vipul.
Aprendi algumas coisas, mas ainda tenho que digerir melhor. Descobrimos que Vipul pertence a casta dos sacerdotes. Combina com ele. Pesquisei no google e vi que é uma casta alta e as pessoas das castas mais altas são veganas, e ele é.
Notei que a paisagem nessa região é bem mais agradável do que a que vi nos percursos anteriores. Não há tanta miséria, existe mais verde na paisagem, casas mais confortáveis, etc. Vipul falou que essa região é habitada por muitas pessoas da religião Jaina ou Jainismo. O Jainismo não difere em grande medida das outras religiões hindus visto que a sua crença está baseada no princípio da reencarnação, mas são mais rigorosos em alguns aspectos. Tem como principal regra a não-violência, são vegetarianos, não matam nenhum ser vivo mesmo que seja um inseto, praticam a meditação e tem uma vida voltada para o espiritual, o místico e contemplativo. A maioria das pessoas que professam essa religião pertencem à classe média de banqueiros e ourives.
Passamos por uma estrada que corta um bosque bem arborizado, um belo passeio. Paramos na cidade de Ranakpur para visitar o templo Jainista Chaumukha Temple. Foi construído no século XIV em mármore branco e seu interior possui 1444 colunas, cada uma muito trabalhada e diferente das demais. Nesse templo tivemos que entrar descalças, nem mesmo uma meia é possível usar. Recebemos um áudio guia sintonizados na tradução espanhol e fui acompanhando de acordo com a as indicações afixadas nas colunas. Até a quinta parte foi tudo bem, daí em diante o aparelho empacou. Mexi pra lá, mexi pra cá, mas não teve jeito de funcionar. Como não tenho a menor predisposição pra ser uma jainista, logo perdi a paciência e tive vontade de socar o áudio guia. Passei a exercitar, então, o hábito da contemplação. O templo é imenso e como é lindo! O ser humano quando quer faz coisas grandiosas e belas, mas só quando quer. Não tem objetos aqui, apenas no altar onde só podemos olhar de longe. É proibido tirar fotos, mas as pessoas não costumam ser obedientes e são chamadas a atenção com frequência. Uma companheira nossa, que deve sair da Índia com umas quinhentas fotos, não resistiu e se rendeu ao flash. Um guarda deu-lhe uma bronca porque estava fazendo pose em frente ao altar.
Chaumukha Temple |
Fomos almoçar no restaurante de um hotel, nos arredores do templo. Um lugar muito bonito e uma comida boa e barata. Poucas opções, o que não é ruim, pois não perdemos muito tempo nas escolhas.
Chegamos em Udaipur no final da tarde, uma cidade completamente diferente das anteriores, mais limpa, construções mais conservadas e o nosso hotel fica num grande lago chamado Pichola. A travessia é em uma balsa que permite aproveitar bem a paisagem do lago. Tem vários hotéis em ilhotas, passamos por um todo branco e alguém falou que é o mais caro daqui. Achei muito branco demais, alguém disse que lembra uma UTI. Cruzes!!!
Está anoitecendo e o brilho das luzes que refletem no lago criam um visual incrível. Um bando de pássaros sobrevoa a balsa e as pessoas perguntam que pássaros são aqueles.
- São morcegos – alguém responde.
Olhei com atenção e vi, são morcegos mesmo e muito maiores do que aqueles que eu vejo voar em volta do pé de jambo no meu quintal. Kátia tem pavor a morcego, trauma de infância, se encolhe toda e fica atenta.
O hotel Leela Palace é um luxo, tá difícil esse ranking pra descobrir qual o melhor. A chegada seguiu o padrão de sempre: uma chuva de pétalas de rosa, alguém coloca uma guirlanda em nosso pescoço, a pinta vermelha em nossa testa, e uma bebida refrescante.
Mais tarde descemos pra o jantar e fizemos um pequeno tour pelo térreo. Na parte externa, próxima a piscina, está acontecendo uma degustação de comidas indianas. Pegamos duas porções e levamos pro restaurante, tá mais fresco aqui dentro.
Pedimos o jantar e nos trouxeram uma cestinha de pães fininhos e crocantes, alguns com especiarias e bem apimentados. Comi vários, apesar da pimenta, estavam bem gostosos e sou apaixonada por pão. A comida também estava boa: uma tijelinha com lentilha e um prato de carne de cordeiro.
Da janela de nosso quarto temos uma vista pra piscina, para o lago e os jardins. Amanhã é dia de conhecer o Palácio da Cidade, o maior da região do Rajastão, cortada por cinco lagos e rodeada pelas Montanhas do Aravali. Considerada a Veneza do Oriente, é um dos pontos mais visitados pelos turistas e uma das cidades mais ricas da Índia. A maioria das cidades que visitamos fica nessa região, então presumo que esse palácio deve ser maior do que aqueles que já visitamos. Ainda há uma família real, que reside no Palácio da Cidade.
30.04.2024
Acordei com a barriga roncando. Fui ao banheiro e, surpresa, uma diarreia. Novidade pra mim. Achei que seria uma vez só, mas em pouco tempo repetiu pela segunda e terceira vez. Muitos gases e diarreia.
- O problema dos gases é que você pensa que é só trovoada, mas pode vir tempestade junto – brincou Kátia.
Desci para o café, mas já estava sentindo enjoo também. Kátia tem pavor a morcegos, Adélia tem pavor a cobras e eu tenho pânico em pensar que alguém pode vomitar perto de mim. Se a pessoa que vai vomitar for eu, pior ainda.
- Não vou sair, estou com enjoo e a trovoada na minha barriga está anunciando tempestade. Não dá pra andar por aí, principalmente com esse calor. Vou para o quarto tomar os remédios que eu trouxe pra diarreia e quando eu melhorar vou aproveitar para ir a piscina e conhecer os jardins. Aproveitem o passeio. "Enjoy".
- Fica tranquila, se precisar de alguma coisa, manda mensagem ou liga pra gente. Vou avisar à Aurea que você não vai – disse Adélia.
Me encaminhei para o elevador com uma certa pressa. A caminhada para nosso quarto é um tanto longa. Quando cheguei ao quarto passei o cartão no leitor e a porta não abria de jeito nenhum. Comecei a ficar nervosa. Vou descer até a recepção...será que vai dar tempo? Quando me aproximei do elevador encontrei com uma funcionária do hotel. Expliquei que não conseguia entrar no meu quarto e se ela podia me ajudar. Não falo inglês, mas o que eu tenho de vocabulário foi suficiente pra ela entender. Ela foi até a porta comigo e viu que eu não conseguia abrir. Disse que ia avisar a recepção e se afastou. Eu já estava desesperada - não vai dar tempo, não vai dar tempo - e passei o cartão no sensor mais uma vez e.... Eureka! A porta abriu. Só deu tempo de sentar no vaso e a tempestade veio com força.
Tirei a roupa, tomei os remédios e me enfiei embaixo das cobertas. Fui ao banheiro mais três vezes e em uma delas vomitei. É a primeira vez que vomito estando só, as duas outras vezes que isso aconteceu, meu marido estava presente. Até que não senti tanto medo como das outras duas vezes.
Passei o dia na cama, bebendo água para não desidratar e cochilando. Não conheci piscina, jardim, lago, nada. O único monumento de Udaipur que eu visitei foi o vaso sanitário do apartamento 207.
01.05.2024 VARANASI
A Adriana estava furiosa com a demora.
- Será que a empresa nos dará alguma compensação? – ela perguntou.
- Talvez a empresa nos ofereça uma cremação grátis – disse Roberto, marido da Adriana, espirituoso como sempre.
- Acho que eu deveria entrar com um processo contra eles. Como será a legislação aqui para esses casos? – perguntou Adriana.
- Deve ser igual a legislação de trânsito terrestre – brincou Roberto – se é que ela existe.
Depois de almoçarmos, sentamos numa fileira de bancos e conversamos enquanto aguardávamos o voo. Notei uma mala que parecia abandonada próximo ao lugar onde estávamos sentadas. Comentei com Adélia:
- De quem será essa mala?
- Sei lá, ela já está aí há um bom tempo. – respondeu Adélia.
- Moço, essa mala é sua? – perguntou Adelia a um homem que estava na fileira de trás.
- Não, quando eu sentei ela já estava aí – respondeu o homem.
- Será que é uma bomba? Pode ser. Melhor avisar pra segurança do aeroporto. - comentei.
O homem levantou e avisou pra funcionária que estava mais próxima. Ela se comunicou com a segurança, mas antes veio falar conosco e em seguida atravessou até as lojas que ficavam em frente de onde estávamos. Lá ela perguntou a mesma coisa pra algumas pessoas. Quando perguntou a Kátia, ela disse que a mala pertencia a Márcia, companheira do nosso grupo.
Cadê a Marcia? Estava por aí, como ela costuma fazer. Quando ela chegou Aurea perguntou:
- Márcia, cadê sua mala?
- Puxa vida!!! Onde será que larguei minha mala? – respondeu a distraída.
Lembram daquele troféu para a mais distraída do grupo? Márcia ganha com folga.
Nosso voo saiu às 21:00h. Quando chegamos a Varanasi o ônibus contratado para nos levar ao hotel nos esperava. O nosso hotel fica às margens do Rio Ganges e só se chega ao hotel de barco porque as ruas aqui nessa região são muito estreitas, nem carro chega até lá. Quem quiser pode ir a pé, mas é longe e difícil se localizar nessas ruelas.
O ônibus parou num lugar muito esquisito. Tinha muita gente, parecia que tinha vários bares e gente falando alto e rindo. Descemos até o rio por um lugar sombrio, mal iluminado. Ajudávamos uns ao outros a descer os degraus que não eram poucos. Vários homens carregavam nossa bagagem que ia no barco junto com a gente. Um horror!
Será que não ultrapassamos o peso? São tantas malas... Enfiei o colete, vai que esse barco aderna e nos entorna no Ganges? Não tenho a menor intenção de me purificar nessas águas. Se no turismo de luxo acontece esses percalços imagine o que acontece com os mochileiros. Parecíamos um bando de retirantes, amarfanhados, descabelados, sujinhos, cansados, alguns bem irritados. O glamour foi pro ralo.
Lembrei de uma história que Adélia havia me contado um dia desses. Ela, Kátia, Carneiro e a esposa, estavam em viajem na Tunísia - ou era um outro país da Ásia? - e foram almoçar num restaurante que ficava em um lago. Contrataram um barqueiro, indicado pelo hotel, e partiram pra ilha. O barqueiro mandou o filho, um jovem aprendiz muito simpático, conduzir o barco até a ilha. O rapaz conduziu, mas não desgrudava do celular. Chegando na ilha ele atracou o barco, ajudou as pessoas a descerem no cais, virou-se para os passageiros e disse:
- Enjoy! – virou as costas e foi para o restaurante.
E durante todo o tempo que ficaram na ilha o rapaz do barco não se aproximou, não deu nenhuma orientação, não perguntou se precisavam de alguma coisa, passou o tempo azarando as garçonetes ou no celular.
Então, em momentos como esse da nossa chegada a Varanasi em que não temos outra opção, eu digo pra Adélia – Enjoy (divirta-se).
No caminho até o hotel o barco foi margeando as Ghats de Varanasi, que são as escadarias que descem até o Rio Ganges. Ao longe vimos três fogueiras no alto da escadaria. Alguém disse que era um crematório. Pensar que tem um corpo ali queimando e a família olhando pra isso, é uma imagem meio chocante pra nós, ocidentais. Um pouco da fumaça vinha em direção ao rio - Será que tem cheiro de churrasco? – Pensei, mas não falei. O cheiro era de madeira queimando. Ainda bem.
Já eram duas horas da manhã quando nos deitamos, exaustas.
02.05.2022
O Hotel BrijRama é um palácio de 1812, um dos edifícios mais antigos do Ghat de Varanasi. Quando os marajás perderam o poder perderam também sua principal fonte de arrecadação, então venderam vários dos seus palácios e muitos deles foram vendidos e transformados em hotel. Os que não eram vendidos, eram abandonados e aqui próximo ao nosso hotel ainda tem uma dessas construções lindas se deteriorando. No alto da escadaria, entramos no hotel e para chegarmos à recepção temos que usar um pequeno elevador muito antigo, com aquelas portas de grades que precisamos puxar para abrir e fechar. Esse é o elevador mais antigo do sul da Asia. A vista dos ghats do Ganges a partir dos quartos e suítes bem mobiliados, são fascinantes. Os quartos ornamentados têm móveis de seda, teto pintado à mão, antiguidades e obras de arte. O nosso quarto é mais simplezinho, mas confortável.
Hotel BrijRama |
Pela manhã tudo parecia muito diferente.
O atraso no voo foi responsável por aquele susto inicial. Durante o dia é que ficamos sabendo que o barco é do hotel, fazem esse transporte diariamente, e os barqueiros são funcionários do hotel. O local onde ocorre o embarque e o desembarque no hotel é ótimo, o mesmo não acontece no local onde desembarcamos para irmos até ao ônibus, mas em se tratando da Índia também não é dos piores.
Caminhamos um pouco até chegarmos ao ônibus. O maior rebuliço, muita gente, vaca, cachorro, lixo, buzina, muitos ônibus de peregrinos que vem se banhar no rio.
- Isso é puro suco de Índia – disse nossa companheira Vera – ainda bem que Deus protege as crianças e os viajantes na Índia.
Passamos por uns ônibus interessantes. São ônibus leito, mas não são altos como os nossos. As pessoas sobem para a cama por uma escadinha e ficam deitados bem próximo do teto do ônibus. Olhando de fora temos a impressão que eles dormem em cima do bagageiro. Imagine a segurança nesses veículos? Próximo de zero.
Vamos visitar o local onde Buda fez seu primeiro sermão para cinco discípulos e dado início à propagação da mensagem que daria origem a uma das principais religiões do mundo de hoje. Dhamek Stupa é um túmulo onde se encontra parte das cinzas de Buda e é, também, um dos principais destinos de peregrinação dos budistas.
O túmulo tem uma estrutura cilíndrica, é bem alto e imponente e fica no meio de um parque com uma grama verdinha, um ambiente tranquilo e silencioso, nem parece que estamos em Varanasi. Um lugar bom pra meditar, mas tem que procurar uma sombra, o sol não dá trégua.
Dhamek Stupa |
Sentamos embaixo de uma árvore frondosa e ficamos ouvindo o guia falar sobre Buda. É muita história e minha memória, que já não tem muito espaço, só conseguiu guardar pouca coisa. Achei interessante o fato de que, apesar de Buda ter nascido indiano (o local hoje pertence ao Nepal) e o Budismo ser hoje a quinta religião do mundo, tem pouco budista na India. O Hinduísmo tem mais de 80% de seguidores, em seguida vem o Islamismo. O Budismo tem menos de 2% de seguidores. Buda nasceu em uma família rica, e aos vinte nove anos resolveu se isolar para pensar na vidar. Depois de muito tempo descobriu a resposta pra todos os problemas e saiu pelo mundo levando a sua mensagem. Uma pergunta não me sai da minha cabeça:
- Adélia, será que em algum momento Buda trabalhou? – perguntei.
- Parece que não – ela respondeu.
- Vai ver que quando ele descobriu que viver é sofrer, desistiu de trabalhar pra não aumentar o sofrimento - conclui.
Continuamos até o centro da cidade e fomos conhecer uma loja de tecidos famosa por aqui. A entrada da Maharani Textiles é bem discreta, não dá pinta do que vai se encontrar lá dentro. Atravessamos por pilhas de tecidos arrumadas grosseiramente, até uma sala grande também entulhada de tecidos. Um indiano de meia idade, muito falante, apresentou-se e começou a “vender seu peixe” o que, diga-se de passagem, ele fez com maestria. Ele é o dono e, se não me engano é o quarto ou quinto da geração dos fundadores.
Mukesh Jain fala um pouco de espanhol e vai preenchendo as lacunas com inglês, segundo ele está falando em Espanglês. Lembrou-me Joel Santana, técnico de futebol, misturando inglês e português.
Olhei para o rosto dos nossos companheiros de viagem, e notei que todos aparentavam um certo desinteresse, apenas achando engraçado o nosso apresentador. Em determinado momento ele pega uma peça grande, enrola no corpo e diz:
- Estoy mui guapo, soy mui sexy – falava colocando as mãos na cintura.
Ele é uma figuraça. Começou a pegar grandes peças de tecido, cada uma mais maravilhosa do que a outra, jogava o tecido aberto no chão a nossa frente e ia falando os preços. Antes ele disse que aqui não há negociações o preço é aquele, quem quer leva. E foi mostrando os tecidos sob os olhares ávidos das mulheres presentes. Começou a citar peças que ele fez para Armani, Kenzo, Hermés, Scafani, Givenchi, todos costureiros famosos. Ele citava o costureiro e mostrava revistas com as roupas criadas com os tecidos. Mostrou também uma matéria, acho que na Vogue, onde ele aparecia sentado numa cadeira cheia de ornamentos preciosos e ele vestido de marajá. Outros artistas também compraram aqui, como Richard Gere, que segundo ele levou 108 peças de uma vez. Na entrada da sala tem mesmo algumas fotos com pessoas famosas, entre elas o Richard Gere.
Canton Palace |
Mostrou um pouco de tudo: sedas, cachemiras, lãs, brocados ao preço de 40, 50, 60 dólares. Eu imaginei, e outras pessoas também, que era o metro do tecido. Ele respondeu que não era o metro, era o preço da peça de sete metros. A mulherada caiu de joelhos sobre aquelas maravilhas. E dali saíram colchas pra camas, toalhas pra mesa, capas de almofadas, caminhos de mesa, tecidos pra quimonos e saris, etc. Deixaram uma boa quantidade de dólares ali. Eu comprei uma modesta capinha de almofada que pode ser colocada numa varinha de madeira torneada e pendurada na parede, como um quadro. A capinha é azul com bordados delicados, combina com meu sofá azul e o azul do céu que inunda minha sala. Pra usar aqueles tecidos sofisticados eu primeiro preciso comprar uma casa que combine com eles. Seria o mesmo que comprar um lustre de cristais pra usar numa casa rústica. Não combina.
Almoçamos no Canton Palace, um ótimo restaurante. Eu ainda não me recuperei do episódio da diarreia. Ela desapareceu, mas não sinto fome e também sinto medo de adoecer nesse final de viagem. Imagine viagem de mais 17 horas, já é cansativo e desgastante, doente então?
Restaurante Canton Palace |
O barco nos levou até o hotel para deixar as compras e sair novamente para andar pelas vielas e assistir uma cerimônia de purificação. Eu e Adelia resolvemos ficar no hotel, tomar banho, dormir um pouquinho e depois então sairmos pra conhecer as vielas. E assim fizemos. Saímos por uma porta lateral do hotel que nos levou a um labirinto de becos onde a gente se perde com a maior facilidade. Esse local nos fez lembrar das favelas do Rio de Janeiro, sendo que aqui dificilmente seremos assaltadas. Pra não nos perdemos fui tirando foto de cada esquina onde dobrávamos, até que chegamos a uma rua larga que descia até o rio. Dali do alto dava pra ver a cerimônia e a quantidade de barcos que ficam assistindo do rio. São muiiitos barcos e imagino que a visão de lá é privilegiada.
Terminada a cerimônia retornamos devagar para o hotel, parando em algumas lojinhas. Chegando lá encontramos alguns companheiros jantando. Eu vou tomar um chá com biscoitos no quarto, tenho que me preservar para o retorno ao Brasil.
03.05.2024
Nascer do Sol no Ganges |
Acordamos as 04:30h para assistirmos ao nascer do sol no Rio Ganges. Muitos outros barcos já estão transitando pelo rio, provavelmente com o mesmo propósito. Algumas pessoas já estão se banhando nas margens e o sol começa a aparecer e vai subindo rapidamente e em pouco tempo os prédios antigos ao lado do rio ganham uma cor dourada muita bonita.
O número de pessoas nas Gaths e nos barcos vai aumentando a medidas que o tempo passa. Podemos observar as pessoas que rezam e tomam banho no rio, outros lavam sua roupa, alguns meditam ou fazem ioga. Apesar de tanta gente a atmosfera é calma e silenciosa. Isso se repete todos os dias. É uma cidade mística, não resta dúvida.
As fogueiras de cremação já estavam sendo usadas. Daqui do barco é possível ver os corpos sendo levados em uma padiola de madeira, ou algo parecido com uma padiola. Os dalits levam os corpos e montam a fogueira. O corpo coberto por uma mortalha coral ou amarela é de um homem, se for vermelha é de uma mulher. Antes de cremar, o corpo é banhado com água do rio e depois com óleo e pasta de sândalo.''Apenas homens participam da cerimonia na hora da cremação, As mulheres não podem entrar no local de cremação. As razões pra esse procedimento são várias e muito antigas. Vou citar as principais: no tempo dos marajás as esposas costumavam se jogar na fogueira para morrer quando o exército daquele reino perdia a batalha e o reinado passava para povos mulçumanos; as mulheres choram muito e atrapalham o espírito que está desencarnando; as mulheres são mais frágeis e estão sujeitas a serem possuídas por espíritos malignos - explicou nosso guia."
Voltamos ao hotel para o café da manhã e partida para o aeroporto.
Chegamos em Delhi antes do meio-dia. Nosso ônibus e nossos amiguinhos, já estavam a nossa espera. Vipul, todo vestido com uma roupa tradicional indiana – túnica, calça e aquele sapatinho com o bico pra cima, tipo sapato do Aladim – deixou as véias mais assanhadas do que de costume. Diga-se de passagem, somos todas véias, ou quase, exceto Carolliny. Ele disse que estava vindo de uma cerimônia; esse guia não é de se jogar fora.
Fomos visitar o Gandhi Smiriti, local onde Mahatma Gandhi morreu. Essa mansão cercada por belos jardins, pertencia a um amigo de Gandhi que lhe deu pousada nos seus últimos 144 dias de vida. Ele foi assassinado em 30.01.1948 por um antigo seguidor.
“A motivação alegada para o crime foi a postura assumida por Gandhi considerada como traição aos hindus por, supostamente, ser a favor da separação dos muçulmanos indianos e ter sido brando com o Paquistão, o novo país recém-formado pelas antigas regiões de maioria islâmica da Índia (ambos tinham ficado independentes da colonização britânica no ano anterior, 1947). O assassino, Nathuram Vinayak Godse, foi condenado à morte um ano após o assassinato, sendo executado em novembro de 1949.’’ - nos explicou Vipul.
A mansão foi transformada em museu. Começamos a caminhada pelo quarto dele, muito simples, como é de se esperar. Ali estão, além da cama e um outro móvel, objetos pessoais como vestes, o cajado, os óculos e as sandálias (que lembram um pouco as sandálias dos nordestinos brasileiros). Depois outras salas com fotos, documentos históricos, condecorações, presentes, etc. No final passamos por corredores com maquetes muito bem feitas, protegidas em caixas de vidro, que contam a trajetória dos vinte anos de luta de Gandhi contra a ocupação inglesa.
No lado externo do museu, margeando o jardim onde ele caminhava todos os dias até o seu local de oração preferido, onde foi assassinado, foi feito um caminho de pedras com as pegadas simbolizando a sua última caminhada. No local exato onde ele tombou, existe hoje um pequeno memorial.
Gandhi Smiriti |
Resolvemos ir ao Khan Market para as últimas comprinhas. Paramos um tuc-tuc e perguntamos o preço já sabendo que temos que regatear. O motorista disse que estava acontecendo uma manifestação e as ruas perto do Khan Market estavam interditadas. Sugeriu um outro mercado que fica ali perto também. Kátia pediu para mostrar uma foto do local e vimos que era a mesma roubada indicada quando chegamos na India. Sob os protestos do motorista, retornamos ao hotel. Logo a frente parou um tuc-tuc e perguntamos sobre o mercado e ele nos disse a mesma coisa. Desistimos do mercado e resolvemos ir jantar.
04.05.2024
Hoje é aniversario da Renata e o grupo combinou de tomarmos o café da manhã com ela. Cantamos parabéns, abraçamos Renatinha e comemos o bolo. Ela me lembra aquela personagem de um desenho animado antigo, a Penélope Charmosa. Ela é bem magra está sempre bem arrumadinha.
Antes de sairmos do hotel descobrimos que a história dos motoristas de tuc-tuc era falsa, não havia nenhuma manifestação e o Kan Market funcionou normalmente. Filhos de uma égua!!! Nos enganaram mais uma vez, devem fazer parte da máfia do outro mercado. Esses indianos podem ser muito pacíficos, mas são bem mentirosos.
Hoje o dia é livre em Nova Delhi. Fomos as compras no Kan Market, um lugar muito legal, tem produtos pra todos os bolsos, dos mais caros aos mais baratos e o melhor, não tem vendedores enchendo o saco. Fizemos nossas comprinhas e retornamos para o hotel, hora de arrumar as malas porque no início da madrugada estaremos partindo para o aeroporto.
Entramos no quarto e o frio estava demais. A maior dificuldade nessa viagem foi conseguir apagar todas as luzes e ajustar a temperatura. Tudo muito moderno e complicado para que já passou dos sessenta. Em um dos hotéis não havia interruptores. Perdemos um bom tempo procurando e quando íamos ligar pra recepção percebemos que um rádio relógio numa mesa de cabeceira tinha os comandos para desligar (para ligar era o cartão inserido no sensor perto da entrada). Em outro hotel a dificuldade era desligar os abajures. Duas companheiras de viagem resolveram o problema afrouxando as lâmpadas. Só Jesus na causa.
05.05.2024
Meia noite partimos para o aeroporto de Deli, que está sempre lotado de gente andando pra todo lado, sentados no chão, nas cadeiras. Parece a rodoviária do Rio de Janeiro em véspera de Carnaval. A viagem foi melhor do que eu esperava, porque consegui dormir um pouco. Passei também algum tempo de pé na parte traseira do avião, conversando com Cristina e um casal de Cabo Frio, que estava voltando de uma visita ao filho que mora na Austrália. Imagine, quatorze horas até Dubai e mais quinze horas até o Brasil? Não gosto nem de pensar.
- Ficar aqui no "recuo da bateria" ajuda muito, né Angela? - falou Cristina.
Concordei com ela, isso encurtou um pouco o tempo de espera e me deixou menos cansada. Quando cheguei na rodoviária peguei o primeiro ônibus, não me preocupei nem em saber o trajeto, tudo que eu queria era comprar uma água com gás, um biscoito globo de polvilho e me enfiar num ônibus da 1001.
Consegui ficar sentada sem companhia ao meu lado, era tudo que eu queria. Depois que terminei de comer o biscoito, apaguei. Fato inédito para mim, dormir em ônibus.
- Senhora, senhora...acorda, já chegamos em Rio das Ostras - me dizia uma mulher.
- Eu vou pra Macaé – respondi meio tonta, sem saber o que estava fazendo ali em Rio das Ostras.
Só então me dei conta que havia pego o ônibus de horário que tem o pior trajeto: Rio x Macaé pela Via Lagos. Bobagem, isso é o de menos depois de uma viagem com 19 horas de voo.
CONSIDERAÇÕES
Porque você escolheu viajar pra esse lugar? Você não tem medo de comer aquelas comidas? O povo é muito sujo, cuidado com o que come lá. Olha com cuidado por anda lá e não saia sozinha? Vc viu o caso da brasileira estuprada por sete indianos? Muito cuidado porque lá a faixa de risco para estupro é de 07 a 100 anos.
Essas foram algumas das perguntas que ouvi de amigos meus. Pra todos dei a mesma resposta:
- Quero ter uma experiência nova conhecendo um país totalmente diferente dos que já conheci.
Interessante que tem gente que mora no Rio de Janeiro me fazendo essas perguntas. Mais perigoso que viver no Rio hoje, só a Ucrânia.
Essa escolha foi aleatória e o que primeiro me motivou foi o fato de viajar com Adelia e Kátia. Fizemos tantas viagens juntas e fazia tempo que eu não aceitava convites delas. O segundo motivo é que tenho três amigos que amam a India e um que odeia. Resolvi arriscar e ver qual deles está com a razão.
Confesso que não é um lugar onde eu voltaria, não tem para mim mais atrativos. Acho que as pessoas que retornam e gostam tanto daqui, são aquelas ligadas as questões espirituais, carma, reencarnação, meditação, ioga. Eu me interesso por esses assuntos apenas para conhecer e procurar compreender, mas não sou espiritualista, apenas respeito. Gosto de conhecer a cultura, a história, a comida, os hábitos de um povo, admirar a beleza de um lugar. Isso é o que me motiva.
Gostei de conhecer melhor o sistema de castas que ainda existe no país, e acho ótimo que isso esteja mudando. Apesar do governo não admitir, a verdade é que a divisão por castas está fortemente enraizada na mentalidade e cultura dessa sociedade. Existem leis que proíbem tratamento discriminatório e muitos negam que haja preconceito por casta, mas no momento que o guia nos explicou sobre o seu próprio casamento e como é feita a escolha do parceiro (a) eu percebi o quanto essa divisão ainda está presente na sociedade. É o mesmo que acontece no Brasil com relação a escravidão, que mesmo tendo sido abolida, deixou sequelas ainda não extintas.
Essa divisão também existe entre outros povos, a diferença de classe social, nível cultural, e religião, também são fatores que pesam nas escolhas pessoais. Mas acho que na Índia isso é muito mais abrangente e mais do que o sobrenome, a profissão ou recursos financeiros, o que define o status social pra eles é a casta. Penso que o fato desse sistema se basear em um dogma da religião predominante, torna mais difícil sua mudança. É quase como discutir o dogma da criação do mundo, que está presente na maior parte das religiões ocidentais.
Então, depois dessa experiência descobri que há motivos pra amar e odiar a Índia, até porque são conceitos subjetivos que variam de acordo com características pessoais. Pretendo continuar aprendendo sobre a Índia através de filmes e séries indianas. Embora Bollywood - a indústria de cinema da língua Hindi - exaltar as caraterísticas mais palatáveis da cultura indiana, já estou mais preparada para extrair o que mais me interessa. Aliás, nessa viagem faltou conhecer a cidade de Mumbai, que nas minhas leituras na juventude, ainda se chamava Bombaim. o nome Bollywood é uma junção de Bombaim e Hollywood.
Acho que satisfiz meu desejo e espero ter saúde para conhecer mais algum país asiático.
INDIANOS
TOUR PELOS HOTEIS (UMA VIAGEM À PARTE)
Imperial Hotel New Delhi