Chegamos na Fazenda Montelage que pertence as primas e primos Faturine Adami, por volta das 09h e depois dos abraços já fomos pra mesa do café.
Trouxemos uma broa com goiabada, um bolo de aipim, pão, presunto e queijo. Eu gosto de bolo de aipim, mas não qualquer bolo, esses que ficam meio burrachudos não gosto. Esse que Ana Eliza fez está realmente com uma textura de bolo. Adorei! O Fogão a lenha esquentando o ambiente e o filtro de barro me trazem tantas lembranças: o cheiro de banana cozida na chapa, o angu da panela de ferro, o perfume da Açucena na beirada do rio, as férias na Fazenda onde nasci, no Frade, e os passeios na casa de meus avós no Córrego do Ouro. Tia Mafalda agachada na cozinha, os demais sentados em volta ouvindo os causos que ela e papai adoravam contar, o calor do fogo esquentando a noite fria. Acho que a maioria dos meus tios tinham essa mania, de contar fatos engraçados.
Terezinha as voltas com o angu de banana pro almoço e o resto do povo comendo e fofocando, menos Júnior, que ficava quietinho observando a mulherada falar.
As historias dos apertos intestinais foram o assunto do dia, quem diria. Uma das primas tinha que fazer um exame e tomou muito laxante. Caminhava para fazer o tal exame e sentiu que o intestino desandava. Quando chegou em frente a loja Resumo da Moda a situação complicou. Viu que tinha um empregado abrindo a loja e se dirigiu a ele:
- Moço, dá pra eu usar o banheiro , tô passando muito mal.
O rapaz foi solidário e levou-a até ao banheiro no fundo da loja. Foi a sorte, mais alguns minutos e o estrago estaria feito. Ela viu que havia um chuveiro e resolveu jogar uma água no corpo para refrescar, tinha suado muito com as cólicas. Depois procurou algo para se secar e só achou um saco de chão dobradinho, que parecia estar meio limpo. "Seja o que Deus quiser" e se secou com o pano de chão. Atravessou a loja, que já estava cheia de clientes, e seguiu aliviada para a rua.
Num outro dia estava ela no centro da cidade quando a dor de barriga começou. Pensou "Vou pegar um táxi para chegar mais rápido em casa, a coisa tá ficando preta". Entrou no carro e pediu pressa ao motorista. O cara não deu muita importância e logo em seguida o trânsito ficou parado e o motorista cantarolando calmamente.
- Olha só, eu pedi ao senhor que se adiantasse, mas o senhor não deu bola. Aviso-lhe que se demorar muito é bem provável que eu cague no seu carro.
O taxista achou uma brecha entre os carros e acelerou. Quando chegou em casa ela pagou a corrida e nem esperou o troco. Foi o tempo de abrir o portão e a bosta escorrer pela perna até o pé. Caminhou lentamente até o banheiro deixando um rastro de titica pelo caminho. Ufa!!! Essa foi por pouco.
Uma outra passou pelo aperto dentro de um ônibus indo pra serra. Esses ônibus que fazem esse percurso não costumam ter banheiros. Foi se espremendo até o destino e chegou lá quase desmaiando.
Uma das primas teve uma prisão de ventre violenta e quando foi evacuar o toletão não saía, botava a carinha pra fora, mas não tinha força. A solução foi pegar uma escova de dente e enfiar o cabo no meio do toletão para desmanchar as fezes duras. Depois de alguns minutos o problema estava resolvido (aviso que a escova foi pro lixo).
Uma outra prima teve uma diarréia anunciada enquanto fazia compras com a nora em pleno Saara no centro do Rio de Janeiro. Avistou um Mac Donalds na esquina e partiu pra lá. Por sorte não tinha fila, sentou no vaso sanitário e fez uma escultura maior que um Big Mac. Seguiu para as compras e quando estava retornando, rumo ao Metro, sentiu o aperto novamente. "Pra ooooode vou?- Pensou''. Um pouco mais a frente encontrou um Bob´s. Que alivio!!! Graças a Deus e a Nossa Senhora dos Fast Foods, escapou da desgraça.
Seguiram para o Metro e qual não foi a surpresa quando o trem partiu? Isso mesmo que você pensou, a dor de barriga voltou com força. Ela não conseguia nem conversar com a nora que estava junto, só respirava e apertava as pernas uma contra outra para impedir que o mundo viesse abaixo. Ainda bem que eram só duas estações e o hotel ficava em frente a saída do Metro. Se arrastou até o Hotel e nem subiu para o quarto, foi direto ao banheiro da recepção. Nesse mesmo dia tinha que voltar pra Macaé. Quando chegou no guichê para comprar a passagem, perguntou ao atendente:
- Esse ônibus tem banheiro?
- Claro que tem. - Respondeu meio surpreso.
- Então me vê uma passagem no corredor ao fundo do ônibus, se possível.
Outra história se passa em uma viagem que ia muito bem, até que a prima contou aos amigos que viajavam com ela que o intestino dela não funcionava há oito dias. Seus amigos (duas médicas, um médico e uma enfermeira) resolveram que iam dar um jeito na situação. A enfermeira comprou um óleo mineral e obrigava a coitada a tomar aquele óleo em jejum.
- E aí foi ao banheiro? Já funcionou? - Perguntou a amiga enfermeira.
- Não, só tá uma ronqueira danada, mas quando sento no vaso só sai um óleo escuro.
No dia seguinte chegaram em outra cidade e compraram dois Clisteres para lavagem intestinal e lhe deram. O amigo médico recomendou.
- Vá pro hotel e nós ficamos por aqui passeando. Assim você fica calminha, sozinha, e aplica os dois clister. Quando a gente chegar você já estará mais leve uns dois quilos.
E assim foi feito conforme a orientação dos especialistas. E quem disse que esse intestino se deixa impressionar. Só funciona quando quer e ainda não era a hora. A única coisa que saiu dele foi o líquido injetado e o resto do óleo mineral.
Já completara 12 dias sem evacuar. Os amigos já não a deixavam comer nada além de verduras. No dia seguinte iriam pegar um avião a tarde e continuar a viagem por mais 16 dias. Os amigos tinham decidido levá-la a um hospital para que retirassem as fezes que, provavelmente, já teriam se transformado em um fecaloma. Não avisaram nada pra ela. Na madrugada desse dia, ela acordou com vontade de fazer xixi e quando sentou no vaso e fez um pouco de força para saírem os gases, caiu algo pesado dentro do vaso. Ficou sentada quietinha, sentindo um vazio dentro da barriga.
- Meu Deus, parece até um aborto. Será que meu intestino saiu pra fora?
Levantou com cuidado e olhou apavorada pra dentro do vaso. Nada demais. apenas a bosta que estava guardada todo esse tempo.
Quando chegou na mesa do café da manhã e encontrou os amigos, falou:
-Tenho um aviso pra vocês. CAGUEI!!!!
Ana Eliza comentou que fez uma cirurgia bariátrica e cortou dois metros do intestino.
- Não é muito? - Perguntei.
- Não. Dizem que o intestino tem entre nove e dez metros.
- Credo! Isso tudo?
- É isso mesmo, o meu tem nove metros - Informou Leila.
- Uma médica, minha amiga, disse que meu intestino deve ser bem longo, por isso passo muitos dias sem evacuar e não sinto nenhum desconforto.
Fiquei curiosa, será que essa é uma característica das Adami? Além da orelha grande que eu sei que é herança da nossa avó Elisa.
Uma delas me perguntou:
- Prima vc peida muito?
- Sim, principalmente pela manhã logo qdo acordo, mas são só gases não tem cheiro.
- Ah! Sempre tem algum fedido pelo meio - disse Ana Eliza.
Parece que esse é o tema desse nosso encontro, os dissabores intestinais. Pode parecer estranho, mas não é de todo ruim. A maioria de nós já está próximo dos sessenta, ou até mais, e nessa idade é comum falarmos de doenças e ninguém aqui lembrou disso, só demos foi risada dessas situações vexatórias.
Terezinha disse que não quis ter filhos e não aconselha ninguém a tê-los.
- Só dão trabalho, despesa e prende muito a gente.
- É verdade, mas você agora tá presa, cuidando dos gatos, cachorros, galinhas....
- Mesmo que eu tivesse encontrado um marido legal, eu não ía querer. Teve até um cara que era bom, marcou um encontro comigo e eu fui toda animada. Quando cheguei lá, que vi o cara, desanimei. Era um ''picolé de asfalto" muito feio. Ouvi dizer que hoje está muito bem financeiramente. Deus sabe de todas as coisas, não era pra ser.
Eu falei que sempre gostei dos neguinhos, Luciana também disse que essa é a preferência dela. Júnior que estava quietinho, logo se manifestou:
- Eu também gosto de uma neguinha.
Todo mundo politicamente incorreto. Quanto mais velho mais difícil de mudar o vocabulário. Um dia a gente chega lá, se não morrer cedo.
Ana lembrou da cozinha de farinha da Fazenda de vovô e do biju que a gente comia fresquinho. Lembrei também do biju, só que esse era da fábrica de farinha da Fazenda do Banco, onde nasci. Quando criança eu gostava de ficar olhando as máquinas trabalharem, e no processo de torragem da massa da mandioca escapava de vez em quando uma pequena porção que ia rodando, rodando, ficava enrolada e torradinha. Eu ficava vigiando para pegar o biju quentinho.
Ana Eliza comentou que a imagem que ela tinha da casa da Fazenda de vovô, era de uma casa muito grande e espaçosa. Ficou muito tempo sem ir até lá depois que a Fazenda foi vendida e quando lá retornou viu que a casa, na verdade, é bem pequena. Eu tive a mesma sensação quando vi a casa muitos anos depois. Acho que na infância temos uma visão exagerada de tudo e quando atingimos a maturidade colocamos tudo na sua devida dimensão.
No final do dia chegaram Jorge, Lamon e Iris, filha de Lamon. Iris é o xodó das tias. Logo já estava solta no terreiro correndo atrás dos cachorros e dos gatos. São três cachorros, seis gatos e umas quarenta galinhas. Os gatos são lindos, todos gordinhos e preguiçosos, ficam dormindo em cima da cama um ao lado do outro.
Por volta das quatro horas começamos a nos movimentarmos pra retornar a Macaé. Tiramos fotos, nos despedimos e às 17h pegamos a estrada de volta a Macaé, antes que escurecesse. Até chegar na estrada principal, abrimos e fechamos algumas porteiras. Lembrei de passar por aqui a cavalo junto com Lene, indo para a Fazenda de Eraldo Resende, onde residiu por um tempo nossa tia Mafalda, que morava com a filha e o genro que era administrador da Fazenda. Éramos adolescentes e esse passeio ficou na minha memória. Não tinha tantas porteiras como agora.
Chegando em Macaé encontramos com uma cavalgada. Ana Eliza disse que a filha e a neta estão lá, as duas gostam de cavalgar. Passamos o dia sem celular, lá na Fazenda atualmente não tem sinal de Internet. Agora que chegamos aqui, o telefone já começa a dar sinal de vida e nos traz de volta a rotina do dia a dia.