12 janeiro, 2011

Senilidade


Minha mãe encarava com bom humor as limitações que a idade foi lhe trazendo, exceto nos dois últimos anos, quando a doença tornou a vida um fardo pesado demais para ela.

Diariamente nos encontrávamos em sua casa: eu, meu cunhado e minhas sobrinhas e mais alguns eventuais que apareciam por lá para tomar café e conversar fiado. Por volta das 18 h quando eu entrava na casa, mamãe me olhava com cara de espanto, levantava as mãos para o alto e dizia:

 – “Graças a Deus você chegou, Maria Jesuína”.

 _ " Mamãe, eu sou Ângela, sua filha "

Jesuína era minha tia, uma irmã da minha mãe que morreu antes mesmo que eu houvesse nascido. Mamãe já não sabia quem eu era mas ficava aguardando ansiosa pela minha chegada.

Algumas vezes ríamos muito das “loucuras dela”. Um dia quando entrei na cozinha - ela estava fazendo café - veio me contar toda agitada que alguém tinha dito que ela teve três filhos mas ela não lembrava de nada disso. Confirmei que isso era verdade e que eu, Vanderlei e Pedrinho éramos filhos dela e Julieta era filha do coração. Ela fez cara de espanto:

- Pedrinho também é meu filho? Será que ele sabe disso? Acho que ele não vai gostar.

Ela tinha por hábito passar boa parte do dia na janela da sala, que fica em frente à rua.Várias pessoas que passavam pela calçada paravam para conversar com ela, o que era muito bom porque ajudava a preencher as inúmeras horas solitárias que normalmente os idosos têm.

Algumas vezes eu a ouvia conversando animadamente com alguém, beijando pra despedir-se e pedindo pra voltar mais vezes.

- Com quem a senhora estava conversando? Eu perguntava.
- Sei não, mas deve ser conhecida, porque parou prá conversar comigo.

Algumas vezes penso nela e é estranho como não consigo me lembrar da sua fisionomia quando mais jovem. Na imagem que sempre me vem à cabeça, ela está debilitada, com o olhar ausente e um sorriso meio sem graça, como se estivesse esforçando-se para sorrir.