28 junho, 2019

BARBACENA

20.06.2019

Saímos cedo de Macaé rumo a Barbacena em Minas Gerais.

Estou fazendo uma espécie de volta ao passado, o que não é algo que eu goste de fazer, principalmente se tive momentos especiais nesse lugar. Quando retornamos depois de um longo tempo, nesse caso há exatos quarenta anos, acho que quebra um certo encanto que só a distância preserva. Acredito no que diz a canção "Nada será como antes, amanhã". Mesmo que o lugar não tenha passado por muitas mudanças, eu mudei, as pessoas com quem eu convivi também mudaram, nada é como antes. Minhas companheiras naquelas viagens da década de setenta, Goretti e Lucia,  estiveram em Barbacena outras vezes, apenas eu demorei tantos anos.

Vamos em dois carros, o de André e o de Goretti, por uma estrada alternativa que passa por várias pequenas cidades, sugestão de André que entende do assunto e nos disse que a estrada está boa, exceto um pequeno trecho de cinco quilômetros que tem muito buraco. Ele segue no seu carro nos guiando, vão com ele sua esposa Eliete e sua irmã Ana Maria. No outro carro Goretti, Lucia, Eu e a fofuxa Lavínia (neta de Goretti). A viagem é longa, de sete a oito horas. Perto de Conceição de Macabu, André parou para comprar beiju e tapioca pra levar pros mineiros, nossos anfitriões. Aproveitamos e compramos beiju doce com coco, para ir beliscando pelo caminho. Um delicia!!! O carro vai ficar cheio de farofa de beiju, não tem jeito de comer isso sem fazer sujeira.

Foi tudo muito bem, até chegarmos em Cantagalo e enfrentarmos a estrada mais esburacada que eu já vi na minha vida. Por sorte não havia muito trânsito, eu até desconfio qual é o motivo, então íamos ziguizagueando para procurar o melhor lugar, ou seja, o menor buraco. De repente uma pancada:

-Ai Meu Deus!!! Disse Goretti, achando que tinha rasgado algum dos pneus.

Não rasgou nada, ainda bem, mas começamos a desconfiar que aquela informação de cinco quilômetros rendeu, tá mais pra quinze.

Paramos pra almoçar no restaurante Silvanda em Dona Eusébia, já em Minas Gerais. Um lugar muito agradável e comida bem mineira. Me fartei de torresmo bem crocante!

Chegamos em Barbacena no final da tarde. No caminho até o bairro onde moram nossos amigos, fui reconhecendo alguns lugares: o pontilhão de pedras conhecido como Arcos Centenários ou Imperiais (não me lembro bem do nome) a igreja São José Operário, que ficava bem destacada no alto de um morro e hoje está cercada de outras construções que diminuíram sua visibilidade, uma esquina onde encontramos no passado Zé Maria e Célio Mazoni saindo de um baile de carnaval. Pelo visto a cidade não passou por grande transformação.

Arcos Imperiais

Basílica de São José Operário

Escola de Cadetes do Ar
Encontramos a família reunida, nos esperando. Que bom reencontrar Leacir, a matriarca que está com oitenta e nove anos, pequenina e magrinha, com meia e gorrinho na cabeça parece uma criança. Lembrou-me minha mãe, que também tinha esse perfil. Marli, que era nossa companheira nos passeios pela cidade, Nice e Débora, crianças naquela época, Vilson e Luizinho eram quase adolescentes. Faltou o Hermes, que hoje mora em Conselheiro Lafaiete. Conheci uma nova integrante dessa família, a Fernanda, que nem era nascida quando perambulávamos por essas ladeiras, enfrentando o frio e o sereno.

Fomos tomar um café na casa da Nice. A casa fica numa ladeira, e a descida até a casa dela é para quem está sóbrio, bebum corre sério risco de chegar na porta da sala rolando. Não é muito diferente da minha casa, meu marido que é chegado a uma "branquinha" já levou alguns escorregões. Encontramos a mesa do café arrumada com pão, queijo, biscoitinho de polvilho, broa de milho e um cafezinho...precisa mais pra estar feliz ?

Dudu e Lavínia
Lavínia resistiu bravamente a longa viagem e agora está se acabando, andando e correndo, gastando a energia reprimida. Encontrou um companheiro, Dudu, que tem a maior paciência com ela. Ele é sobrinho de Eivander (Mozinho, para a família) marido da Nice. Dudu é o chamego da família toda e não é pra menos, é um garoto simpático, carinhoso e com uma carinha de sedutor. Vai fazer sucesso com as meninas.

Entre uma cervejinha e outra começamos a lembrar dos tempos que perambulávamos por essas ladeiras atrás de novidades, novas emoções, novos amores. Conversa vai conversa vem, descobrimos que Mozinho conhece Célio Mazoni, Zé Maria Picareta e Rubinho, nossos amores daquela época, ou melhor, pra ser mais atual o certo é classifica-los como “peguetes” ou no máximo “ficantes”. Mozinho disse que vai marcar com Célio e Zezé para nos encontrarmos no sábado pela manhã num café que eles frequentam no centro da cidade. Mozinho, que trabalhou com Célio quando ele foi prefeito de Barbacena, disse que ele derrotou nas urnas as duas famílias mais importantes da política da cidade, os Bias Fortes e os Andradas. Ganhou, mas não conseguiu fazer um bom governo. É assim mesmo, os bem intencionados quando conseguem romper o esquema instalado no poder e se eleger, não conseguem o apoio necessário para governar.
Mozinho falou que os dois estão bem “acabadinhos” e que nós estamos muito melhor que eles. 

Sei não, acho que é melhor que esse encontro não aconteça. Acho que prefiro lembrar do Célio no seu Dodge Dart azul, bigodão, óculos de grau, e um cheirinho gostoso de colônia Embassy. Zezé, moreno e baixinho, alegre e romântico, gostava de cantar pra mim “Meu mundo Caiu” e “Castigo”. Rubinho era o mais novinho e também o mais bonito, “peguete” de Lucinha. 

De volta à casa de Leacir, sentamos todas em volta da mesa, tomamos um caldo verde e conversamos até tarde. Goretti lembrou de uma viagem que ela fez pra Barbacena em que seu namorado Carlos apareceu sem avisar, na casa de Leacir. Ele achava que Goretti estava encontrando com algum homem aqui de Barbacena e veio conferir. E não é que ele estava certo? Chegou quase junto com as flores que o tal homem tinha mandado pra ela. Segundo Goretti, eu tive que assumir “as flores” e leva-las comigo pra Macaé. Meu Deus!!! Não lembro de nada disso. Marli e Lucia lembraram que numa noite, quando saímos do Gino’s, havia um pequeno tumulto na porta do restaurante. Ficaram olhando a confusão e quando me procuraram não me encontraram. Resolveram ir embora, me deixaram pra trás porque eu estava junto com um bonitão. Quando cheguei em casa elas estavam nervosas:

- O que houve? Porque não veio logo pra casa? 

- Como eu viria se estava vestida apenas com um colarzinho de pérolas.

Minha Nossa Senhora dos Desmemoriados, será que o alemão está querendo me visitar? Não consigo me lembrar de nada disso, só me lembro vagamente da confusão na porta do Gino’s. Matutei um pouco e lembrei que na última vez que estive aqui em 1979, Goretti nem conhecia Carlos. Elas estão querendo me endoidecer.

Hora de dormir. Espalhamo-nos pela casa, ao todo dez pessoas, e antes de adormecer ainda ficávamos ouvindo as conversas e risadas do quarto ao lado. Acredito que estamos atrapalhando o sono do pessoal da casa, principalmente Leacir e Fernanda que acorda cedo pra trabalhar.

21.06.2019

Prados

Eliete vem com frequência a Barbacena porque tem uma loja virtual onde vende artesanato daqui dessa região de Minas. Ela hoje vai fazer compras pra loja e nós vamos acompanhá-la nessa tarefa desagradável para as mulheres, que é entrar em um monte de lojas e fazer algumas comprinhas. Eu só vou passear, nada de compras. Começamos pela cidade de Prado, um lugarzinho bem bucólico que também tem no comércio de artesanato uma de suas principais fonte de renda. Eu ainda não conhecia essa parte da cidade; quando venho a Tiradentes vou sempre a Bichinho, que é Distrito de Prados, visitar os Ateliês de lá. Logo descobri na primeira loja, algumas coisinhas que eu preciso comprar pro sítio. Quando saí da loja com algumas sacolinhas, Débora me sacaneou:

- Ué, não é você que não ia fazer compras? Foi a primeira a aparecer com as sacolinhas. Kkkkkk!

- Lembrei-me que no sítio (tentei disfarçar) eu preciso.... Nada disso, a carne é que é fraca mesmo.

Tapeçaria feita em Tear

Seguimos para Resende Costa, a cidade que produz o melhor artesanato feito em tear aqui dessa região. Venho sempre aqui na época do festival gastronômico de Tiradentes. Hoje não vou comprar nada, só um tapetinho. Eu juro.

Nice cuidou de Lavínia durante quase todo o passeio, nem quer mais saber da avó. Lembro-me da Nice pequena, moreninha com uma franja caindo em cima dos olhos negros. Acho que das filhas é a que mais se parece com a mãe. Débora era ainda neném na última vez que estive aqui, hoje encontrei-a transformada em uma mulher bonita e inteligente. Fernanda é a caçulinha simpática e paciente, atura nossa conversa ruidosa até tarde da noite. Marli não muda, conserva a mesma fala mansa e a mesma generosidade. É uma amiga que o tempo e a distância não afastam. Família grande...ainda tem o Luizinho, Wilson, Hermes. E não há como não lembrar do Benício, o pai dessa turma, que estaria muito contente com a nossa visita se ele ainda estivesse entre nós.

Resolvemos encerrar o passeio passando por Tiradentes, tomaremos um café e retornaremos a Barbacena. Eliete ainda vai voltar a Prado pra pegar umas encomendas e de lá vai pra Tiradentes, onde no reuniremos. Combinamos de seguir o carro de Débora, que conhece bem essa região. Goretti foi dirigindo devagar pela rua principal, procurando pelo carro da Débora. Logo vimos o carro saindo do acostamento e fomos seguindo. Uns trinta minutos depois passamos pela placa que indicava a entrada pra Tiradentes. Ué...Débora passou direto, será que não viu a entrada? Goretti seguiu o carro piscando o farol várias vezes para chamar a atenção, e nada. Lucinha alertou:

- Na hora que o carro saiu pra pista nós só olhamos o carro, mas não conferimos quem era o motorista. Será que não seguimos o carro errado?

- Puta que pariu! Vamos ligar pra elas – disse Goretti.

Paramos no acostamento e ligamos pra todas elas, mas ninguém atendia, na verdade não tinha sinal naquele lugar. Resolvemos seguir adiante porque ainda tem outra entrada pra Tiradentes depois de São João Del Rey. Logo adiante avistamos o dito cujo carro. Eram elas mesmas, não seguimos o carro errado. Ainda bem, senão ia ser a maior zoação.

Chegamos a Tiradentes no finalzinho da tarde. Escolhemos a casa Rocambole & Cia para tomar um café e, talvez, comer o delicioso rocambole que dá nome a casa. Estava lotado, por sorte conseguimos uma mesa no pátio dos fundos. Nesse momento do dia, quando começa a anoitecer, nada me dá mais prazer do que um pão com queijo quente, um café forte e uma fatia de broa. O atendimento foi bem ruim, quase desisti do café. A cidade está lotada de turistas, mas é sempre assim em todo feriado, já deviam estar preparados pra isso. Ana Maria pensou em comprar um queijo, mas desistiu, estava carérrimo. Realmente os preços não fazem jus à qualidade do produto e do atendimento.

Amanhã é dia de ir à feira, bater perna pelo centro, e terminar o dia num churrasco na casa de Nice. Devíamos deitar um pouco mais cedo, mas a conversa nunca se esgota.

Na madrugada acordei e fui ao banheiro e logo que me deitei novamente ouvi um barulho de alguém caindo. Era Leacir. Todo mundo acordou e corremos pra ajudar a leva-la pra cama. Ela logo melhorou e disse que ficou tonta e que isso já aconteceu antes. Segundo Marli ela já teve queda de pressão outras vezes. Amanhã as filhas vão levá-la ao médico.

Começamos pela feira, comprei pimenta biquinho e queijo. A feira é grande, morro acima, o que me fez lembrar que o que eu comprar tenho que carregar morro abaixo e ainda caminhar até o estacionamento bem antes de comprar. Depois fomos até a igreja matriz, tirar fotos nos mesmos lugares que tiramos há tantos anos atrás. Passamos pela Praça dos Andradas e notamos que já não há mais os macacos que habitavam aquelas árvores. Pouca coisa mudou por aqui, as mesmas casas antigas e bem preservadas, alguns prédios novos, acho que nós mudamos mais que a cidade.

Descemos a primeira ladeira depois da praça e chegamos ao restaurante Gino’s Il Candelabro, lugar que frequentamos com Célio e Zezé. Na entrada no prédio vimos uma placa com o ano da inauguração, 1957. Acho que em Macaé não há um restaurante sequer com mais de quarenta anos, o Gino’s tem sessenta e dois anos e conseguiu resistir bravamente a passagem do tempo. Entramos e escolhemos uma mesa na parte lateral, onde as mesas ficam num nicho que dá certa privacidade, talvez a mesma mesa da década de setenta. Pedimos um chopp e ficamos ali recordando “velhos tempos, belos dias”. De repente resolvemos dar uma pesquisada na internet e ver ser encontramos alguma foto mais atual dos nossos amigos, não deve ser difícil porque um foi prefeito e o outro candidato. Encontramos. Jesus! O tempo é cruel. Dois velhinhos. Lucia não concordou, disse que eles estão muito bem e que Zezé está com uma pele linda nessa foto. Acho que ela tá precisando de um óculos de grau, até porque já não é novinha, a visão tá falhando. E não é só a visão.

- Gente, perdi meu celular. Será que o deixei em algum lugar?

- Lucinha, se têm três celulares aqui sobre a mesa e nós somos apenas três pessoas na mesa, acho que há uma grande probabilidade de um desses ser o seu telefone – disse eu.

- Ai, Graças a Deus!

É difícil nessa fase da vida, quem não comete uma distração vez ou outra. Eu faço isso com frequência.

Nosso amigo Célio e o italiano Gino (ao centro)
propietario do restaurante Gino's il Candelabro

Esse restaurante era bem tradicional na cidade, frequentado pela elite local, políticos e turistas. Hoje talvez já não tenha a mesma clientela de outrora.

Encerramos o dia na casa de Nice e Mozinho. Lá pelas tantas alguém falou em ir até a Basílica de São José Operário, acho que foi Ana Maria. Eu topei, vou lá rever a igreja, já nem lembro como ela é. Débora ligou o GPS, mas depois de um tempo vimos que estávamos andando em círculos. Débora desistiu do GPS e enfim chegamos lá, porém a igreja estava fechada. Que pena, nem lembrava como ela é grande e imponente, aqui no alto desse morro com uma vista privilegiada da cidade.

Voltamos pra casa de Nice e pouco depois fomos embora. Subimos os inúmeros degraus até a rua e Goretti, que já tinha bebido todas, pegou uma penca de chaves na mão e disse que a chave do carro não estava ali. Começou a procurar em volta do carro, perto do portão...Débora desceu até a casa pra ver se encontrava a chave. Eu olhei as chaves na mão dela e vi a caixinha preta onde ficam os comandos de abrir/fechar o carro.

- Goretti, essa caixinha não é da chave que fica escondida dentro? Aperta o botãozinho. 

- Kkkkkk. Não acredito que eu fiz isso.

Muito doidinha.

23.06.2019

Acordamos e o café com pão de queijo fresquinho que Débora já tinha comprado estava sobre a mesa. Depois do café fomos acomodar toda a bagagem no carro. Cheguei a pensar que não caberia, mas conseguimos, só tem que ter cuidado na hora de levantar a tampa do porta malas, pode cair tudo no chão. 

Tá um sol morninho, dá vontade de ficar esquentando aqui. Sentei ao lado de Leacir que estava pegando um solzinho e conversamos sobre meus pais. Ela conheceu toda minha família, meus pais, avós, meus tios, quando eles ainda moravam na Boa Vista, lá perto de Glicério. Me contou alguns episódios daquela época, da minha irmã do coração, Julieta, do meu avô Pietro. Muito bom conversar com alguém que tem uma memória sobre a sua família anterior a você mesmo, são coisas que a gente só fica sabendo por alguém que viveu aquela época. 

Hora de partir, nos despedimos de todos e prometemos não demorar tanto pra voltar. Goretti acomodou Lavínia, que se comportou muito bem nessa viagem, não reclamou, não fez pirraça...uma lady, e partimos rumo a Macaé.

ANTES                                                                                      DEPOIS







































FAMILIA SILVA

Nice, Mozinho, Lucia, André e Goretti
   
Leacir e Vilson






Goretti, Débora, Marli, Fernanda e Nice
Nice e Lavínia



Vilson e Lavínia

Débora, Lavínia e San
Marli